sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Confesso que ouvi (I de III)


Neste ano, resolvi dividir as listas entre internacionais, nacionais e latinos, pras coisas não ficarem nem tão injustas, nem tão díspares, nem tão enlouquecedoras pra serem escolhidas. Já aviso que, de internacional, meu interesse pelo mainstream continua baixíssimo, que os sudacas continuam mandando muitíssimo bhem em todas as áreas do pop-rock, e que, vergonha!, só ouvi rap antigo em 2018, não tenho nada novo pra comentar decentemente. Mas, vamos lá.


INTERNACIONAIS

Geometria [Thy Catafalque]
Certos caminhos da música extrema underground ora levam a arestas que chegam a machucar, ora a tempestades de névoa escura, atordoante, e ora, como no caso deste novo disco dos húngaros do Thy Catafalque, em que você se vê diante de uma paisagem tão esquisita e diversa do que você já presenciou, que fica até difícil descrever: sei lá se é black metal, se é metal, se é rock...?, tem jazz, pop, barulho, ambiente, você até se perde nos círculos concêntricos, sem que tudo vai acontecendo, ainda que sem muita pressa. O rótulo avant-garde cabe perfeitamente aqui, só não sei do lado que qual subgênero mais. E isso é muito, muito legal.
Ouça: Sárember




Heir To Despair [Sigh]
Terei que me repetir novamente [texto de 2015], só trocando o disco: "Os japoneses malucos do Sigh também são obrigatórios em qualquer lista de melhores sempre que lançam álbum, uma vez que a mistura de black/thrash metal com j-pop, heavy tradicional, jazz e eletrônico, às vezes tudo ao mesmo tempo, é sempre imperdível (...) mais uma boa mostra do quão amplo é o horizonte dos extremos da extremidade musical". O legal da banda é isso, tudo pode acontecer, tudo sempre acontece, você só não sabe pra qual dos TUDOS o disco vai puxar em cada lançamento. Em Heir To Despair, puxa mais pra melodia, como em Graveward [2015], por exemplo, do que pra desgraceira, como em In Somniphobia [2012], pra ficar nos lançamentos mais recentes. Mas quem é fã pode ficar tranquilo que as esquisitices e imprevisibilidades estão todas lá – como um power-thrash com flautas renascentistas e escalas asiáticas de guitarra ao mesmo tempo –, do jeito coeso & competente de sempre. E, de lambuja, a capa mais bonita do ano.
Ouça: Aletheia





Höllenzwang – Chronicles Of Perdition [Abigor]
Os veteranos austríacos apareceram lá na ‘segunda onda’ do black metal já fazendo um som bem diferente dos então referenciais nórdicos, com vocais afundados na mixagem, três guitarras e baixo que até hoje não se sabe se é feito na guitarra mesmo ou apenas está em volume mínimo, além de criativo uso de levadas medievais obscuras e uso de tímpanos na bateria. Após longo hiato, tentaram voltar duas vezes, com discos irregulares, que nitidamente tateavam por um lugar na cena atual, chegando a ‘modernizar’ o som com elementos eletrônicos. Mas desta vez deu certo: este disco mantém as características essenciais do grupo, tem tudo para agradar fãs de Deathspell Omega, com seu som massivo e sufocante que infestou a cena atual, para o bem [novos paradigmas] e para o mal [centenas de cópias], fornecendo uma cinzenta queda direto para a escuridão.
Ouça:
Christ's Descent Into Hell





In The Blue Light
[Paul Simon]

A luz melancólica parece ter finalmente incidido sobre o incansável Paul Frederic Simon: aos 77 anos, resolveu regravar versões [na minha opinião] mais melancólicas de canções suas de outrora [tem coisa do There Goes Rhymin’ Simon (1973) até o So Beautiful Or So What (2011)]. Mas claro que alguém que há dois anos fez o excelente Stranger To Stranger [que figurou na lista daquele ano, inclusive] não faria nada preguiçoso: mudaram-se arranjos, estruturas harmônicas e até letras. Goste-se ou não das versões, nenhuma delas é preguiçosa ou protocolar. Porém, quase todas mais reflexivas, agridoces, ainda que sem perder o tom instigante. Para ouvir em momentos de desejada solitude. Pois, talvez, Paul Simon esteja apenas dando aquela respirada mais prolongada, de quem já não precisa se apressar.
Ouça: Can't Run But




Penumbra [MØL]
Para este terceiro disco do quinteto dinamarquês MØL eu vou copiar o que escrevi na lista de 2015 sobre Laurestine, do nova-iorquino So Hideous: “...disco de post-metal/shoegaze que é meio como viver: desesperado, barulhento, ora apenas caótico, hora por demais emotivo, mas sempre intenso, ao ponto da exaustão, quando vê interstícios de calmaria pra você tomar fôlego e viver/ouvir mais”. Quem não estiver iniciado nesse subestilo de extremidade, pode até, vejam só, descobrir agora, ouvir o disco em versão instrumental, sem os vocais sofridíssimos, degustando apenas as dinâmicas post-róquicas do disquinho.
Ouça: Storm




Menções honrosas para Faunalia, dos italianos do Selvans, uma espécie de mistura de Agalloch com Panopticon – vai do black metal intenso e desesperado à placidez dos interlúdios cheios de folk e melodia, mas sempre com ares de solidão numa imensidão de neve e floresta numa manhã congelada [e que capa bacana]; Ordinary Corrupt Human Love, quarto disco dos american black metal hipsters que tanto amo, mas que, neste disco, ainda que muito bonito e sempre emocionante, mostra a banda nitidamente atirando em várias direções para tentar ir além da mistura de black metal desesperado + post-rock, que chegou ao mesmo tempo à perfeição e a um beco sem saída no disco anterior [New Bermuda, de 2015]; e para Down Below, com o black-thrash-rock sempre divertido do sueco Tribulation, com muitos riffs e levadas entre o bangueante e o pop para distrair a mente dos lançamentos mais intensos desta listinha.




En passant, também recomendo: o EP novo do Iron & Wine [Weed Garden], habitué deste blog [citado pelo terceiro ano], com seu folk sempre repleto de serenidade; os discos novos de Mouse On The Keys [Japão] e The Reign Of Kindo [EUA], ambos mais relaxados e menos intensos/virtuosos em suas misturas de pop, prog e jazz que o de praxe, mas mantendo bons momentos; I Loved You At Your Darkest, do death/black polaco Behemoth, que, se não é uma revolução como o trabalho anterior, é um passo bem certeiro no mesmo caminho, um aperfeiçoamento da nova fórmula, por dizer assim; o retorno do black metal psicodélico norte-americano do Nachtmystium, sempre bem-vindo, ainda que me nível ligeiramente inferior aos últimos trabalhos; o epônimo dos espanhóis do Hyedra, um post-rock/metal imponente à Tides From Nebula e Russian Circles; Aura Noire, dos noruegueses do Aura Noir, fazendo o divertido black-thrash de sempre, na linha Tribulation/Hail Spirit Noir, só que bem mais tosco e descompromissado; os caipiras black-metal do Wayfarer e seus climas dark-faroeste em World’s Blood, direto do Colorado; o post-rock melódico e grandiloquente, cheio de cordas, à Sleepmakeswaves, do Autumn Creatures [EUA]; da Finlândia, Solitude, trabalho em que o Totalselfhatred atinge a maturidade para equilibrar o desalento e a beleza melancólica do seu post-black metal; e Sylvaine – nome artístico da one-woman band Kathrine Shepard – cujo único defeito em seu Atoms Aligned, Coming Undone é a excessiva duração das músicas, o que às vezes deixa seu post-metal pesadão + viajante um pouco carente de novidades; e ainda descobri que o Opera IX continuou lançando discos após a saída da vocalista Cadaveria [este The Gospel é simpático], que o Mayhem remixou/remasterizou o já excelente A Grand Declaration Of War [2000] e ficou FODA, com um som mais quente/cheio, e uma capa igualmente impactante, e que saiu full-length do The Smashing Pumpkins [nunca sei quando tem banda e quando Sr. William demite todo mundo], mas aí não deu tempo de ouvir.

Logo mais, as listas brasileira e latina. Fiquem ligadinhos.

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