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de novo iPhone. Grandes bosta. U2 vai tocar no lançamento. Ah, legal.
U2 vai apresentar novo single nesse pocket show. Ah, os singles
anteriores não me animaram, mas enfim. Eita porra, U2 tá lançando disco
novo, sem aviso prévio, de graça na internet!, alguém baixa pra mim
porque eu não instalo iTunes nem fodendo.
Assim foi aquela terça-feira, em que a maior banda de todos os tempos (porque Beatles não conta e porque nenhum outro grupo ou artista se manteve no topo, dando nortes e ditando regras, mantendo a relevância e sendo alvo de discussão, por 38 anos) lançou seu álbum inédito, grátis, numa arriscada jogada de marketing, para 500 milhões de pessoas (e faturando US$ 100 milhões para isso).
Antes de qualquer coisa, claro, veio a síndrome do haterismo indie-hipster: “ainn eles estão invadindo meu iCloud (?) que horror eu não quero essa banda”. Sim, porque faz parte de ser legalzão na internet desgostar de qualquer unanimidade de outrora ou mesmo de agora há pouco. Aquelas coisas de ‘Beatles não era tudo isso, bom mesmo era The Kinks, The Electric Prunes, The Zombies ou qualquer coisa da época’.
Tanto faz se você gosta das músicas que não vão a lugar nenhum do Radiohead, das bandinhas subCamelo do Baixo Augusta que têm vergonha da guitarra ou se excita com coisas realmente decrépitas e constrangedoras como Rolling Stones ou 1/2 The Who, o negócio é dizer que U2 é ruim, que o Bono é chato, e que o último disco bom foi o ________ (insira aqui qualquer coisa antes de 1992).
Obviamente, a chiadeira durou um ou dois dias, o lançamento foi um sucesso, todo mundo tratou de formar opinião sobre o lançamento, mesmo sem ouvir o disco, e é claro que os shows deles aqui, provavelmente no ano que vem, vão lotar novamente, como encheram em 1998, 2006 e 2012, cheio de pessoas que jurarão, anos depois, que bom mesmo era aquela banda do interior da Escócia que provavelmente eles nem conheciam na época.
Para além disso, era ouvir um disco que vinha de singles mais ou menos, sucedendo um disco bem fraco, talvez o pior da banda (No Line On The Horizon, de 2009), que por sua vez sucedia um dos melhores discos dos caras (How To Dismantle An Atomic Bomb, de 2004, seguramente o melhor da década).
Como, coincidentemente, eu tinha começado a ler (sim, com muitos anos de atraso) a autobiografia U2 By U2 – e, até por isso, estava e estou ouvindo a discografia para manter o clima –, todo o contexto da narrativa da banda em todos esses anos estava bem claro em minha mente quando houve o inesperado lançamento de Songs Of Innocence (título que cita William Blake).
Como sempre desde os 2000s, a banda estava buscando origens, raízes; era o U2 voltando pra casa mais uma vez. Desde que saíram da Irlanda rumo a América, e de lá para Berlim, a banda tentava retornar aos primórdios, com discos pretensamente mais simples, como All That You Can’t Leave Behind (2000), ou mesclando quase todas as suas fases no mesmo opus (o já citado How To Dismantle...).
Songs Of Innocence (que, supostamente, precede a continuação Songs Of Experience) é um trabalho em torno da infância de Bono Vox, quando ele era apenas Paul David Hewson. Não por acaso as origens retratadas nas letras já foram espalhadas por todos os discos da banda: a morte da mãe, a difícil relação com o pai, os conflitos político-religiosos na Irlanda, as angústias da juventude, as bandas que fizeram sua cabeça (como The Clash e Ramones), os primeiros shows, a primeira viagem aos EUA.
Muito embora, musicalmente, o disco realmente não acrescente muito – assim como o No Line..., parece ter sido feito em uma semana, o que não é exatamente grave se pensarmos que até 2004 a banda estava em plena forma –, careça de grandes rocks e baladas pungentes, e até parece ter sido mal organizado na ordem das faixas (a ‘curva emocional’ do disco não funciona muito bem), é um disco que não mancha a estrada do grupo, e é digno para uma banda que teve quase 15 anos de auge e não precisa provar mais nada pra ninguém pelo menos desde 1991.
O fato é que, em pleno 2014, uma banda lançar um álbum conceitual, contrariando a indústria (que julgava acabados os discos, em detrimento dos singles, após a consolidação da música digital), e ao mesmo tempo dando norte a esse mesmo mercado (fazendo um lançamento espetacular e imprevisível desse produto tido como anacrônico), mostra que o U2, trinta e oito anos depois, com tantas mudanças de direção e pelo menos três discos que mudaram a música popular e influenciaram tudo que veio depois, continua um passo à frente.
O mundo precisa desse disco?
Não.
Os fãs precisam desse disco?
Talvez.
A banda precisa desse disco?
Com certeza, e é isso o que importa no final das contas.
Que cada passo, decidido ou em falso, continue sendo à procura do que eles ainda não encontraram.
Assim foi aquela terça-feira, em que a maior banda de todos os tempos (porque Beatles não conta e porque nenhum outro grupo ou artista se manteve no topo, dando nortes e ditando regras, mantendo a relevância e sendo alvo de discussão, por 38 anos) lançou seu álbum inédito, grátis, numa arriscada jogada de marketing, para 500 milhões de pessoas (e faturando US$ 100 milhões para isso).
Antes de qualquer coisa, claro, veio a síndrome do haterismo indie-hipster: “ainn eles estão invadindo meu iCloud (?) que horror eu não quero essa banda”. Sim, porque faz parte de ser legalzão na internet desgostar de qualquer unanimidade de outrora ou mesmo de agora há pouco. Aquelas coisas de ‘Beatles não era tudo isso, bom mesmo era The Kinks, The Electric Prunes, The Zombies ou qualquer coisa da época’.
Tanto faz se você gosta das músicas que não vão a lugar nenhum do Radiohead, das bandinhas subCamelo do Baixo Augusta que têm vergonha da guitarra ou se excita com coisas realmente decrépitas e constrangedoras como Rolling Stones ou 1/2 The Who, o negócio é dizer que U2 é ruim, que o Bono é chato, e que o último disco bom foi o ________ (insira aqui qualquer coisa antes de 1992).
Obviamente, a chiadeira durou um ou dois dias, o lançamento foi um sucesso, todo mundo tratou de formar opinião sobre o lançamento, mesmo sem ouvir o disco, e é claro que os shows deles aqui, provavelmente no ano que vem, vão lotar novamente, como encheram em 1998, 2006 e 2012, cheio de pessoas que jurarão, anos depois, que bom mesmo era aquela banda do interior da Escócia que provavelmente eles nem conheciam na época.
Para além disso, era ouvir um disco que vinha de singles mais ou menos, sucedendo um disco bem fraco, talvez o pior da banda (No Line On The Horizon, de 2009), que por sua vez sucedia um dos melhores discos dos caras (How To Dismantle An Atomic Bomb, de 2004, seguramente o melhor da década).
Como, coincidentemente, eu tinha começado a ler (sim, com muitos anos de atraso) a autobiografia U2 By U2 – e, até por isso, estava e estou ouvindo a discografia para manter o clima –, todo o contexto da narrativa da banda em todos esses anos estava bem claro em minha mente quando houve o inesperado lançamento de Songs Of Innocence (título que cita William Blake).
Como sempre desde os 2000s, a banda estava buscando origens, raízes; era o U2 voltando pra casa mais uma vez. Desde que saíram da Irlanda rumo a América, e de lá para Berlim, a banda tentava retornar aos primórdios, com discos pretensamente mais simples, como All That You Can’t Leave Behind (2000), ou mesclando quase todas as suas fases no mesmo opus (o já citado How To Dismantle...).
Songs Of Innocence (que, supostamente, precede a continuação Songs Of Experience) é um trabalho em torno da infância de Bono Vox, quando ele era apenas Paul David Hewson. Não por acaso as origens retratadas nas letras já foram espalhadas por todos os discos da banda: a morte da mãe, a difícil relação com o pai, os conflitos político-religiosos na Irlanda, as angústias da juventude, as bandas que fizeram sua cabeça (como The Clash e Ramones), os primeiros shows, a primeira viagem aos EUA.
Muito embora, musicalmente, o disco realmente não acrescente muito – assim como o No Line..., parece ter sido feito em uma semana, o que não é exatamente grave se pensarmos que até 2004 a banda estava em plena forma –, careça de grandes rocks e baladas pungentes, e até parece ter sido mal organizado na ordem das faixas (a ‘curva emocional’ do disco não funciona muito bem), é um disco que não mancha a estrada do grupo, e é digno para uma banda que teve quase 15 anos de auge e não precisa provar mais nada pra ninguém pelo menos desde 1991.
O fato é que, em pleno 2014, uma banda lançar um álbum conceitual, contrariando a indústria (que julgava acabados os discos, em detrimento dos singles, após a consolidação da música digital), e ao mesmo tempo dando norte a esse mesmo mercado (fazendo um lançamento espetacular e imprevisível desse produto tido como anacrônico), mostra que o U2, trinta e oito anos depois, com tantas mudanças de direção e pelo menos três discos que mudaram a música popular e influenciaram tudo que veio depois, continua um passo à frente.
O mundo precisa desse disco?
Não.
Os fãs precisam desse disco?
Talvez.
A banda precisa desse disco?
Com certeza, e é isso o que importa no final das contas.
Que cada passo, decidido ou em falso, continue sendo à procura do que eles ainda não encontraram.