terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Quem é ateu

Uma queria amiga me deu de Miguxo Secreto (confraternização do pessoal d'A Doze Mãos) o livro Serial Killer: Louco Ou Cruel, da Ilana Casoy. Até aí, tudo ótimo, eu já estava começando a ler outro livro dela, Serial Killers Made In Brazil. O mais engraçado é que os dois marcadores têm propaganda de livros espíritas. E um deles é tão impagável que vou reproduzir aqui.
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O ATEU
Romance do Espírito
Antônio Carlos
Psicografa (sic) da médium
Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho
O que leva alguém a não acreditar em Deus? Jean Marie, o Ateu, e seus amigos (sic, sem vírgula mesmo) são farristas que vivem apenas para o presente. Residentes na Toca – outrora conhecida como a Fazenda São Francisco –, transformaram o lugar em palco de festejadas reuniões, onde reinam o vício e a chantagem. Jean Marie reserva-se o direito de não apenas descrer do Criador, mas também de influenciar os outros com seus escritos. Perseguido por um espírito que deseja vingar-se, pressente o perigo: uma terrível ameaça ronda a Toca...
***
Preciso comentar? Depois, quando os ateus reclamam de perseguição e discriminação, os crentes contemporizam...

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

City of blinding lights

Morar em São Paulo é uma experiência engraçada: enquanto 80% da população aprova do governo Lula, aqui vivemos em um reduo tucano/pefelista, cheio de “cidadãos de bem” que lêem Veja, vêem Jornal Nacional, cursam Direito, Medicina ou Economia, acham que “direitos humanos são para humanos direitos”, São Paulo é a locomotiva do Brasil” e “o problema aqui são os nordestinos”. Temos bairros de baladas caras, bairros de cafonas prédios neoclássicos, bairros de publicitários descolados. Temos academias cheias de marombados e esticadas, com seus pitbulls mal educados e suas crianças gordas educadas pela TV. Os prédios da Berrini são todos espelhados e modernosos, o trem que passa por lá é melhor do que os outros e tem aé uma ponte lá perto que deve ter custado uns três eurotúneis. São Paulo mais pára, no trânsito e nas idéias, do que anda. Como diz nosso governador, “finge que funciona”.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Hollow-hearted, heart-depart

[Texto escrito de supetão, e, logo, passível de incongruências, inverdades... e de ser uma porcaria mesmo.]

Pensando em um amigo e no pai de outro amigo que morreram (coincidentemente, ambos de infarto) no final-de-semana frio e chuvoso, revendo a solidão de Travis Bickle em Taxi Driver, os desencontros e a tristeza dos personagens de Dolls, lutando contra meus males do corpo e do espírito, e fazendo um check-up desajeitado das pessoas que entraram na minha vida e saíram dela este ano – algumas fizeram ambas as coisas em 2008 mesmo – pensei em como todo mundo idealiza a vida como um dom sagrado ou se faz de mártir com ela servindo de cruz, o que é a mesma coisa, só que com o sinal trocado; obrigação de ser feliz ou tentativa contínua de ficar triste, ou de parecer um ou outro. Não faz diferença, na verdade, sena nos entregando as pessoas ou apenas as usando – e todo mundo usa enquanto finge se entregar. Qual personagens de Genet ou Caio Fernando Abreu, estamos à deriva, e muito pouco podemos fazer ante às contingências. E, mesmo assim, infelizmente, somos responsáveis por nossos inevitáveis fracassos. Todo mundo é parecido quando sente dor; depois, se julga individual.

[É, ficou uma porcaria mesmo.]

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Te alcanço em cheio o mel e a ferida.

Escrever bem é sexy. Não sei se é com todo mundo, mas, para mim, poucas coisas ('tá, não tão poucas) são sensuais como textos redigidos com estilo e correção, com aquele algo mais apaixonante que mostra o igual tesão da pessoa que emite as palavras.
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Ênclises no início das sentenças, travessões separando apostos mais longos, mesóclises oportunas como um bom sexo oral, hifenes que são verdadeiras carícias, e até o trema, ah, que delícia, que pretendem tirar de nós como se fosse uma perversão para a sociedade.
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O cidadão comum, do dia-a-dia, tem agora patrulhado até seu prazer mais íntimo, o de se perder no gozo da linguagem. Logo estaremos todos insatisfeitos sexualmente com ditongos separados, lugares-comuns, letras maiúsculas depois de reticências.
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O papel é um infinito de possibilidades prazerosas no qual a única regra é a de você fazer o que tem vontade, mesmo que seja o de realizar seu desejo mais inconfessável.
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Particularmente não gosto de construções pretensiosas e prolixas como posições de kama-sutra. Não são necessárias invencionices para o texto levar ao orgasmo intenso.
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Tal como no sexo, o segredo na literatura é entrega.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

I read the news today, oh boy.

http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI3356615-EI8139,00-SC+isolada+dona+de+casa+enterra+marido+no+quintal.html

E por causa dessa enchente
Esse restolho de gente
Precisou ser enterrado
Sob o quintal cimentado
Por sua triste consorte
Que se enganou tão forte
Em sua própria morada
– Eis que a escuridão lhe aguarda.

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http://maeducacao.blogspot.com/2008/07/morte-nossa-de-todos-os-dias.html

“Pegue seu filhinho morto!”
Estivesse numa feira
O coveiro só gritava
“Cada caixãozinho torto
Desses anjinhos à beira
D’uma cova tão barata"
Em nosso Estado que mata
Não valia quem cavava.

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http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI2903937-EI306,00.html

Mora lá no cemitério
Além da filosofia
Sem ninguém na vida inteira
Sem lugar na superfície
Recolheu-se à imundície
Com a morte sempre à beira
Como ninguém já dizia
A morte é não haver mistério.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Faça outra lista de grandes solos de guitarra

793 – Slaget Om Lindisfarne (Enslaved)
All Because Of You (U2)
Cancer Of The Heart (Skyclad)
Ciranda (Uns & Outros)
Invejo Os Bichos (Barão Vermelho)
Liberdade/Guerra Fria (RPM)
Máquinas Macias (Lulu Santos)
Master Of Puppets (Metallica)
Mistério Do Planeta (Novos Baianos)
Storms Of The Elder (Einherjer)

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Reflexões impopulares nada eclesiásticas

"O homem é a única criatura que se recusa a ser o que é." (Albert Camus)

1. Jesus, levando chibatada e bebendo vinagre, é um ícone sadomasô.
2. A Bíblia é o maior compêndio sobre violência já feito.
3. Religiões são a institucionalização da esquizofrenia.
4. Não acredito em Deus, ele é muito mentiroso.
5. Deus é o Papai Noel dos adultos.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Faça uma lista de canções sobre velocidade para você acelerar junto e acabar como James Dean ou Albert Camus

120...150... 200 Km Por Hora (Roberto Carlos)
Fuel (Metallica)
Highway Star (Deep Purple)
It's So Easy (Guns N' Roses)
Machinehead (Bush)
Wheels Of Fire (Manowar)

terça-feira, 4 de novembro de 2008

E não importam se os olhos do mundo inteiro possam estar voltados...

“Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos / Dando porrada na nuca de malandros pretos / De ladrões mulatos / E outros quase brancos / Tratados como pretos / Só pra mostrar aos outros quase pretos / (E são quase todos pretos) / E aos quase brancos pobres como pretos / Como é que pretos, pobres e mulatos / E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados.” (Caetano Veloso & Gilberto Gil, Haiti)

Primeiramente, reproduzirei a matéria inteira que deu na Folha de domingo último.

São Paulo, domingo, 02 de novembro de 2008

Tensão no Congo reaviva espectro de Ruanda

Eclosão do atual conflito foi precedida pela chegada de levas de refugiados, piora da pobreza e violência étnica intermitente

Epicentro é Goma, cidade miserável no leste cercada por campos de deslocados; situação ecoa traumas do genocídio no país vizinho

FÁBIO ZANINI
EM GOMA
(REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DO CONGO)

Muhindo, 28, tem marcas de queimadura pelo corpo; Joseph, 32, teve o irmão de 14 anos morto a machadadas; Hélène, 45, foi vítima de estupros.

No leste da República Democrática do Congo, cenas semelhantes às do genocídio da vizinha Ruanda, em 1994, continuam nos dias hoje.

Na última semana, um confronto de quase 15 anos, com alguns intervalos de calma, reacendeu-se de forma especialmente intensa numa região rica em minérios, disputada por vários grupos armados.

Dessa vez, o estopim foi o avanço do general rebelde congolês Laurent Nkunda, que controla 5.000 homens, sobre Goma, uma cidade miserável, já congestionada com refugiados de outras ondas de violência e semidestruída por lava vulcânica. É lá que se baseiam a ONU e várias ONGs.

Nkunda diz perseguir remanescentes da etnia hutu que se refugiaram na mata congolesa após comandarem o massacre de quase 1 milhão de pessoas, grande parte da minoria tutsi, durante o genocídio de Ruanda. Seu discurso é o de proteger os tutsi de mais uma matança -e suspeita-se que ele receba apoio do governo tutsi ruandês.

Nem o Exército do Congo, uma força desmoralizada e corrupta, nem os 17 mil soldados da ONU na região têm conseguido deter o avanço de Nkunda. Na semana passada, ele, unilateralmente, declarou um cessar-fogo às portas de Goma, definido como uma "chantagem política" pela ONU, provocando pânico na cidade.

O Alto Comissariado das Nações Unidas (Acnur) estima em 20 mil o número de refugiados internos procurando abrigo numa cidade que já abriga precariamente 100 mil pessoas.

"A situação é crítica. Nosso pessoal na região está impossibilitado de visitar os campos de refugiados para ajudar as pessoas", disse por telefone o vice-diretor do Acnur no Congo, o moçambicano Antônio José Canhandula.

Revolta latente

O último intervalo de paz já durava desde janeiro, quando foi assinada uma trégua entre as facções armadas. No final de maio, a Folha passou três dias em Goma e percebeu uma cidade sem violência, mas em ponto de ebulição. Uma dezena de campos de refugiados, muitos abrigando etnias rivais, rodeiam uma cidade de 600 mil habitantes que tem apenas uma avenida asfaltada, um punhado de lojas, praticamente nenhum serviço de saúde e desemprego de 90%.

Um destes campos é Mugunga 2, a 12 km do centro de Goma. São 9.000 pessoas morando em cabanas de madeira e palha, cobertas com a característica lona branca do Acnur.

O chão é de lava solidificada, herança das erupções do monte Nyiragongo, presença ameaçadora sobre a região. Por isso, caminhar é difícil, e o espaço para cultivo é limitado. Pequenas hortas de mandioca e feijão se espremem entre as cabanas.

Ao meio-dia, pequenas fogueiras começam a aparecer. Numa delas, uma mulher destampa a panela para mostrar uma pasta verde. É uma espécie de purê de mandioca, que, acompanhado de banana e farinha, será o almoço dos filhos.

Carne ou frango na refeição são raros. Crianças de menos de dez anos dobram o corpo para carregar nas costas vasilhames alaranjados com água. "Temos problemas de malária, infecção respiratória, doenças sexualmente transmissíveis e, no caso das crianças, má nutrição", diz Felix Mirindi, enfermeiro do posto de saúde local. Há um médico que passa duas vezes por semana.

Os refugiados de Mugunga 2 formam um panorama abrangente dos grupos que disputam o leste do Congo.

Ismail, 25, fugiu das FDLR (Forças Democráticas de Libertação de Ruanda), sigla que identifica os hutus ruandeses que escaparam após o genocídio, muitos procurados por participação ativa na matança.

Segundo a ONU, esse grupo se financia controlando o acesso a minas de ouro e cobalto. Calcula-se que tenha de 6.000 a 20 mil homens armados, um fator permanente de ameaça para o governo de Ruanda, que, por isso, estaria ajudando o general Nkunda.
"A FDLR invadiu minhas terras. Tive que fugir para não ser morto", diz Ismail, que caminhou os 300 km de sua cidade, Walikale, até Goma.

Nkunda, que teve um aliado indiciado pelo Tribunal Penal Internacional no início deste ano, também tem sua cota de atrocidades. "Eles castram os homens e estupram as mulheres", diz um morador do campo, exibindo marca de uma machadada que levou no pescoço.

Há ainda dezenas de grupo locais de autodefesa que surgiram também para resistir aos hutus, chamados genericamente de "mai-mai", mas que acabaram descambando para o banditismo. Seu tamanho real é desconhecido.

A ONU e o Exército do Congo estabeleceram como prioridade repatriar os hutus para Ruanda -por convencimento se possível, pela força das armas caso não seja. Na prática, não têm conseguido sucessos militares e tiveram de recuar de suas posições frente ao avanço dos rebeldes.

Enquanto o conflito se prolonga, os campos vão se tornando permanentes. Em Mugunga 2, já há uma escola primária, uma feira livre e um hospital. Na praça central, uma quadra de vôlei improvisada.

O que começou há um ano e meio como um pequeno conjunto de cabanas hoje é uma comunidade organizada, em que cada grupo de 50 forma um quarteirão, com seu "prefeito". "Só sairemos daqui quando o governo garantir a nossa segurança", diz um morador.

***

Quem assistiu a Hotel Ruanda e/ou Abril Sangrento sabe que esse conflito originou-se do colonialismo belga, que invadiu Ruanda e escolheu a etnia tutsi, de pele mais clara, como quase-elite, em detrimento dos hutus, mais escuros. Quando o colonialismo acabou, os queridos europeus foram embora, deixaram as etnias lá em ebulição – aliás, eles nunca entenderam direito o que são etnias, visto que a maioria dos conflitos africanos perenes são por causa de misturas indevidas de culturas que o velho-mundistas achavam a mesma coisa – até que, em 1994, houve um atentado ao governo hutu, que reagiu massacrando mais de 800.000 tutsis – creio que os únicos sobreviventes foram os que se esconderam no hotel retratado no supracitado filme. E hoje temos esse revanchismo tutsi. E a culpa e, claro, do homem branco. Como disse Michael Moore em Stupid White Men, se eu vejo um branco se aproximando de mim, mudo de calçada na hora. Eles são um perigo.

E sabe por que os EUA e a ONU pouco ou nada fizeram para evitar o massacre? Simples: no Afeganistão, havia passagem de gás do Cáucaso; no Iraque, obviamente, petróleo; no Leste Europeu, branquinhos eslavos. Já Ruanda, ao contrário de países vizinhos (como o Congo), nem os chamados diamantes-de-sangue tem... lá só existem... pretos.

“...Quase todos pretos / Ou quase pretos / Ou quase brancos quase pretos de tão pobres / E pobres são como podres / E todos sabem como se tratam os pretos.” (Caetano Veloso & Gilberto Gil, Haiti)

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

¿O que pode essa língua?

Nunca disse “em mangas de camisa”, mas acho engraçado quando leio isso num livro – e é comum nos mais antigos. Acho xixi pior que mijo, e cocô, pior que merda. Gosto de dizer “quiçá” de brincadeira, é uma palavra legal, e uma vez, numa conversa num pub, eu e um amigo dissemo-na ao mesmo tempo – caso provavelmente único no mundo. Sou meio avesso a estrangeirismos, por isso costumo usá-los em itálico, ou mesmo evitá-los. Não perco uma chance de mesoclisar. Minha palavra preferida é laranjeira, mas também adoro azálea – é minha flor preferida e tem um nome que expressa bem sua beleza; não gosto quando a chamam de azaléia (mesmo que o dicionário já aceite). Gosto da palavra palavra, e eu sei que já disse isto, mas só custar-me-ão algumas palavras para repetir: ainda morro de palavra!

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Faça uma lista de grandes músicas sobre suicídio

A Day Without Me (U2)
Beyond The Realms Of Death (Judas Priest)
Exit (U2)
Fade To Black (Metallica)
Glemt (Enslaved)
In My Darkest Hour (Megadeth)
Lágrimas E Chuva (Kid Abelha)
Space-Dye Vest (Dream Theater)
Suicide Is Painless (M*A*S*H Soundtrack)
Suicide Veil (Anathema)
Viernes 3 AM (Charly García)
When All Else Fails (Skyclad)

[Percebe-se que no Brasil o suicídio é ainda mais tabu do que em outros lugares; exceto pela versão de Viernes 3 AM que Os Paralamas Do Sucesso fizeram, o tema segue inédito no pop-rock e mesmo no metal-sem-ser-splatter-porque-aí-não-vale, o que exclui também bobagens como o death metal Plunged In Blood, do Sarcófago. A músicas precisam ser dolorosas, realistas, não escatológicas.]

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Sum burrus, sum ducor.

A burrice, como eu costumo dizer, é a coisa mais democrática que existe: está ao alcance de todos, sem discriminação de sexo, posição social, religião, nada. Tem pra todo mundo. E é isso que eu sinto quanto aos paulistanos após a vitória acachapante do Kassab sobre a Marta ontem.

Os cidadãos-de-bem, dos quais morro de medo, esse tipo de gente escrota, stupid white men, preferirão (re)eleger um LADRÃO – sim, digo isso com todas as letras porque o patrimônio dele triplicou quando ele era secretário do Pitta – em detrimento da competente e honestíssima Marta, porque ela é “antipatias”, traiu o marido”, é “perua”. Além disso usam-se arjumentos como os coqueiros da Faria Lima (das plantas que o Alckmin colocou no Tietê, ninguém falou nada), do dinheiro gasto no túnel da mesma avenida – dinheiro que, por contrato, só podia ser gasto lá – e das ínfimas taxas de luz e lixo, que pouca diferença fizeram ao eleitorado demo-tucano, gentalha leitora de Veja, que vê Jornal Nacional e, assim acha que está informada sobre tudo e pode até se achar formadora de opinião.

Marta fez CEUs, Bilhete Único, acabou com a máfia dos transportes (e renovou toda a frota, além de fazer os corredores exclusivos), deu um puta talento cabuloso no Centro, fez os telecentros, a Galeria Olido. Mas a tucanalha paulista prefere acreditar que chega remédio em casa pra todo mundo que precisa, que realmente há dois professores em sala de aula (e não que um deles, e nem em todas as escolas tem, não passa de um estudante de Letras). Lembram da Lei Cidade Limpa, que, com seu radicalismo, faliu uma porção de empresas que trabalhavam com esse tipo de mídia. Ninguém lembra de ele espancando um senhor no posto de saúde, nem ele fazendo piada sobre o buraco do metrô – sobre o qual o responsável direto, Alckmin, jamais se pronunciou, ele mesmo que disse ter acabado com o PCC e sumiu também quando a cidade foi dominada pelos criminosos.

Ninguém lembra, aliás, fingem não lembrar, de que ele é LADRÃO, LADRÃO, LADRÃO, e de que Democratas é a putaquepariu, essa merda é o PFL, que, por sua vez, é Arena, e, antes, UDN. Deixemos tudo bem claro aqui: o paulistano médio é um estúpido que compra a idéia do “rouba e finge que faz”. Sou paulista e já desisti, repito.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Hacked up for barbecue

[17h14min] Sabe, às vezes sinto vergonha de minha profissão, dá vontade de pedir pra cancelarem meu MTB. O que a imprensa brasileira (sim, sei que mundo afora é assim também, mas estou falando específica e empiricamente daqui) faz com cada tragédia é uma coisa revoltante. Sempre tem o João Hélio da vez. Depois do moleque, cujo espetáculo de grotesquidão teve direito a apresentadores à Datena pedindo pena de morte, redução da maioridade penal e o caralho e demais absurdos "jogando pra torcida" e até uma reconstituição do crime filmada ao vivo!, tivemos os mesmos desdobramentos inúteis no caso Isabela Nardoni. Qualquer não-fato novo-velho era devorado com sofreguidão pelos abutres-jornalistas. E nos últimos dias tivemos uma emocionante [/bocejo] não-evento: vários dias com as câmeras focalizando uma janela semi-aberta, enquanto pseudocomentaristas de boteco faziam análises psico-sociológicas sobre o seqüestro da Eloá e de sua amiga Nayara. Chegou-se ao cúmulo de hoje, após consumada a tragédia, a Globo anunciar uma matéria com a intenção de "orientar os pais sobre o namoro de adolescentes". Morri. Sabem, eu ainda acredito no biscoito fino para as massas, no melhor estiulo mariodeandradeano. Temos, sim, uma curiosidade mórbida para as coisas, devido à nossa confusões para lidas com questões de vida/morte – tememos nossa finitude –, mas a imprensa devias dar o exemplo e educar os espectadores com um material mais analítico e menos sensacionalista. Encarar os monstros sem temer tornar-se um deles. E, em casos como esses, a mídia faz de todos nós criaturas desprezíveis. [17h23min]

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Vai indo que eu não vou

Recuso-me a falar de eleições num pleito no qual o LADRÃO do Kassab venceu o primeiro turno para prefeito e o vereador mais votado foi o Gabriel Chalita. Esta cidade realmente merece o pior pela gentinha que tem.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Faça uma lista de grandes músicas do Iron Maiden

Aces High
Genghis Khan
Infinite Dreams
Killers
Lord Of The Flies
No Prayer For The Dying
To Tame A Land
22 Acacia Avenue
2 Minutes To Midnight
Sea Of Madness

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Reflexões matutinas

1. Primeiro turno é domingão; embora a Marta esteja na liderança, não estou animado porque dificilmente ela leva no segundo turno – kassabistas, alckmistas e malufistas são todos da mesma laia e unir-se-ão contra o PT, sem dúvida. E teremos mais quatro anos de atraso, descaso e roubalheira nesta malfadada cidade. E confesso que não fiz minha parte: talvez acomodado com a superioridade do plano de governo e das realizacões do governo anterior da Marta, pouco fiz para angariar votos e adiei minha filiação ao partido uma vez mais. Acho que desisti de São Paulo, na real. Pena que continuo nela.

2. O horário eleitoral gratuito, especialmente a apresentação dos vereadores, é involuntariamente engraçada até você se dar conta de que aquilo não é para ser divertido; aí, diante de semi-analfabetos, pseudocelebridades e toda sorte de pára-quedistas – de um Enéas Filho apócrifo ao filho do RR Soares, passando pelo Luiz Carlos do Raça Negra, o Kid Bengala e o Dinei –, bate um desãnimo profundo.

3. Odeio os jingles grudentos dos candidatos (nesse quesito, os do Kassab são imbatíveis, se bem que minha namorada fica cantando o da Marta, aqele do "carrega na catraca", toda hora nos meus ouvidos.

4. A campanha atingiu níveis de tosqueira populistas dignos (?) de feira-livre: "Pra passagem não aumentar, vote Kassab", "Vote Marta e tenha internet de graça, volte a carregar o bilhete único na catraca e tenha metrô na periferia", "Vote Maluf e tenha 779596 novas pistas nas marginais"... o que o Alckmin fala só me dá sono, portanto confesso que nem prestei atenção até agora.

5. Levy Fidélix e o aerotrem (copiado do monotrilho d'Os Simpsons), hein? Citei-o porque o tiozão de bigode pintado merece um tópico só pra ele.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Perguntar ofende

Por que as pessoas ficam melindradas quando digo que o cinema brasileiro é o pior do mundo?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Olhos iguais aos seus

Quais são os limites da empatia?

Outro dia me peguei olhando as flores roxas de um ipê caindo sobre a calçada do outro lado da rua e pensei duas coisas:

1. se mais alguém estava percebendo aquilo;
2. se mais alguém estava percebendo aquilo daquela forma.

E não me refiro só à percepção da cor, da forma, mas sim do ato e tudo que ele representa ali, naquele momento, para mim, numa mini-epifania entre tantas que tenho, para o bem e para o mal, durante cada dia.

Como será viver a vida de outrem?

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

E outros quase brancos tratados como pretos só pra mostrar aos outros quase pretos

Hoje, no bumba lotado (primeiro de dois) rumo ao trampo, pensei lá com meus botões: se ali meus olhos passavam por uma balada de playboy chamada Senzala – lugar onde ficavam os escravos, todos pretos –, e havia outro lugar badalado de nome Favela – lugar onde ficam os pobres, quase todos pretos – e ninguém acha de mau gosto, se eu abrisse um bar chamado Zyklon B, Auschwitz ou Mengele, acusar-me-iam de anti-semitismo?

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Nada mais me deixa chocado

Impressionante como quem mais reclama do trânsito caótico de São Paulo, cada vez pior, é a classe média, que compra carro adicional para ignorar o rodízio e circular todos os dias com todo o conforto, e as empresas de transporte de carga, que vêm trocando caminhões por vans, a fim de burlar as restricões para veículos de carga. Enquanto isso, quem anda de ônibus, trem e metrô, sem conforto, ar-condicionado, música ou dinheiro, já acostumado com tudo isso desde sempre, respira fundo o ar viciado do coletivo abarrotado para se acalmar em mais um dia expremido no ir-e-vir cotidiano da vida alienada.

Impressionante como todo mundo, exceto eu e minha namorada, fuma maconha. A coisa anda tão descarada por toda a parte que é até engraçado tudo isso. Dá-lhe financiamento do crime organizado, já que compram em vez de plantar.

Impressionante como aqueles clássicos velhos xavecadores, mesmo sem a menor chance ou intenção de pegar as menininhas, mandam ver nos vecos mais trash, a fim de talvez provar para eles mesmo que ainda são capazes, que não perderam o jeito para puxar conversa com jovens senhoras ou senhoritas.

Impressionante como os simulacros vêm aumentando de tal forma que até artistas que já vieram ao Brasil, e até sem tanto alarde, causam tanta celeuma e correria para compra de ingressos e destaque na mídia: a bola-da-vez é a Madonna, a qual veio nos 90s fazer playback, na mesma época do Michael Jackson (RIP), e ninguém nem ligou muito – nada como desta vez, assim como foi diferente o U2 '98 e o U2 '06. Don't believe the hype. E quem é fã mesmo se fode pra comprar ingresso e periga nem ver o show por causa dos curiosos de ocasião, massa-de-manobra do showbizz.

Impressionante como eu demoro tanto pra atualizar e escrevo um post ruim como este.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

A palavra perdeu o poder de curar, é somente um vírus que distorce o real.

“De repente a pergunta é: ‘o que você está dizendo com ela?’, e não ‘você consegue tocar assim?’, ou ‘qual é a sua velocidade?’. A pergunta é ‘o que você está fazendo com seu instrumento?’, ‘o que está sendo comunicado nesta canção?’. De repente, as guitarras não eram uma coisa para agitar na frente da platéia, mas sim algo que você usava para chegar à multidão... eu tive que reexaminar totalmente meu jeito de tocar, aprender a reconhecer que as notas realmente significam alguma coisa. Penso nas notas como uma coisa cara. Você não pode simplesmente jogá-las para todos os lados.” (David “The Edge” Evans)

Que isso sirva se lição não só pra mim – fazer trampos (de guitarra, de literatura, de vida) redondos, perfeitos, coesos e concisos, burilados à exaustão, até que não haja mais no que mexer, sequer uma nota fora do lugar – mas para todos os artistas patéticos que tenho criticado nos últimos posts.

Faça uma lista de grandes músicas do U2

01. Acrobat
02. Beautiful Day
03. Drowning Man
04. Exit
05. Luminous Times
06. Miracle Drug
07. New Year's Day
08. The Unforgettable Fire
09. Tomorrow
10. Until The End Of The World

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Dança do quadrado

“O rock é uma coisa mais quadrada, assim, de verso-refrão-verso.”


Essa foi a justificativa de Lucas, o vocalista do Fresno, sobre o porquê de a experiência de tocar com Chitãozinho & Xororó ritmos como country, marcha-rancho e moda-de-viola era enriquecedora, durante o Estúdio Coca-Cola.

Bom, evidentemente que C & X são grandes músicos, têm uma carreira respeitabilíssima e eu me sentiria muito honrado em participar de algo com eles. O problema é o rapaz me sair com uma pérola dessas, praticamente dizendo que o rock é um estilo limitado.

[Nem vou comentar o quanto foi irrelevante a contribuição dos fresnos para as canções de C & X com suas guitarras fracas e melodias óbvias tocadas por músicos medíocres.]

Após a perplexidade, a fúria, a tristeza e o ataque de gastrite nervosa, comecei a pensar em discos convencionais e quadrados de rock como Highway 61 Revisited, Revolver, Quadrophrenia (opa), Are You Experienced?, Gita, Acabou Chorare, Selvagem?, Transformer, etc. e acabei concluindo, resignado, que o rock DELE, o som que ELE faz é quadrado porque ele faz parte de uma banda e de uma geração bunda-mole que não aprende nada com o passado e só quer saber de faturar com o que está na onda momentânea. Um cara que diz isso nunca ouviu os discos supracitados na vida. Banda clássica pra ele deve ser o Fall Out Boy. E ele deve andar preocupado demais pintando as unhas e fazendo franjinha pra se preocupar com referências musicais audaciosas e instigantes.

[Post escrito ao som de Seu Francisco. Agora com licença, vou colocar o Transa pra rolar aqui. Discos que descem redondo como cervejas. E que caia um paralelepípedo, bem quadrado, cúbico, pesado e duro, na cabeça dos fresnos.]

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Don't believe the hype

O que bombava em 68?
O que bombava em 78?
O que bombava em 88?
O que bombava em 98?
O que bomba em 2008?

Pense.

A música melhorou ou piorou?

Claro que não piorou (até porque isso é muito subjetivo); é muita ingenuidade artística achar que a qualidade da música pode ser medida pela mídia, que existem "movimentos", que há épocas melhores ou piores para a música.

Em todas as épocas há gente inovando, buscando caminhos instigantes, e gente a favor da maré, tentando se enquadrar no que a mídia deseja. E como a indústria cultural só estende seus tentáculos massificadores ano após ano, cada vez mais tem negociatas de empresários que colocam os cifrões acima da qualidade e gente que se prostitui por grana e fama. Como correr atrás da onda é o mesmo que tentar morder o próprio rabo, cada coisa minimamente nova que surge vem acompanhada de uma porção de aproveitadores loucos para surfar na marola que a última onda causou.

Só para citar exemplos: os Raimundos, extremamente originais, e descobertos de formas genuína pelos Titãs e pelo Miranda, geraram uma enorme febre de forró-core, de modo que tivemos que aturar horripilâncias como Catapulta e outra do qual nem lembro o nome, mas que tinha uma versão forrocorizada de Tudo Azul, do Lulu Santos; quando o já fabricado Charlie Brown Jr. apareceu, o Dr. Bonadio Frankenstein não se contentou em faturar uma vez só e clonou sua cria não só uma, mas duas vezes (Tihuana e O Surto).

Bobagem achar que não há mais boas bandas em Seattle desde 1992, por exemplo; só deixaram de procurá-las por lá, assim como deve haver um monte de caipiras cheios de laquê fazendo hard-farofa em New Jersey e branquelos raquíticos misantrópicos querendo destruir o cristianismo na Noruega. Tudo depende do interesse midiático. Ou nenhuma música boa foi feita no Brasil durante as ondas de lambada, sertanejo, pagode, axé e pancadão? E agora, após o tosco revival 80s e em pleno império emo (pagode com guitarras), não há gente fazendo boas sonzeiras por aí?

E isso serve de preâmbulo pro que vemos hoje.

Tive o desprazer de acompanhar o último Top 10 da MTV (devem ser os únicos dez clipes que eles ainda passam, já que virou um canal sub-Home & Health.), e o que vi?

À exceção do Weezer, do qual não gosto, mas sei que é uma banda de verdade, e apresentou um clipe mais ou menos criativo (mesmo que a idéia de fã-clipes tenha sido usada aqui pelo finado Gram uns três anos antes), o resto parecia a mesma música com mixagens visuais e sonoras um pouco diferentes. De Fall Out Boy e My Chemical Romance, passando por Pussycat Dolls, Alanis Morrisette e Avril Lavigne, eram superproduções cheias de efeitos, linguagem visual acelerada, roteiro brega e cheio de clichê e músicas parecidíssimas – tudo over, nem muito leve, nem muito pesado, pastel-de-vento total, com letras inócuas e rebeldia blasê calculada.

Fiquei triste por quem se perde naquilo, deixando de conhecer tanta coisa boa do passado e do presente, e feliz por estar alheio a isso, ouvindo e fazendo a música que me agrada. Mas é assim mesmo: os Beatles não foram recusados por uma gravadora em 1962 porque "aquele negócio de grupos de rock já estava fora de moda"? Então...

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Pequeno perfil de um cidadão comum

Corpo de inglês é achado na cama 2 anos após morte

Da BBC Brasil

O corpo de um aposentado inglês ficou dois anos deitado sobre sua cama até ser descoberto pela polícia em sua residência, na cidade de Huncoat, no noroeste da Inglaterra, depois que os vizinhos reportaram sua ausência.Brian Dean, de 70 anos, foi encontrado depois que os policiais arrombaram a porta de sua casa e se depararam com o corpo sobre a cama.

Pelas correspondências encontradas na porta da casa de Dean, os policiais concluíram que o aposentado estaria morto há dois anos."Acreditamos que o corpo de Dean estaria na casa há dois anos porque a correspondência data de 2006 e estava empilhada atrás de sua porta", afirmou o inspetor Jill Johnston, da polícia local."Sabemos que ele era um homem muito reservado e é muito triste que ninguém tenha sentido sua falta durante tanto tempo", disse.

Os policiais informaram ainda que o corpo estaria sendo analisado para determinar a causa da morte e a polícia estaria tentando encontrar familiares para informar sobre a morte do aposentado.

Segundo os policiais, as autoridades locais não sentiram a falta do aposentado pois todas suas contas eram pagas via débito direto em conta e ele recebia dinheiro mensalmente por conta de sua aposentadoria.

Segundo os vizinhos, Dean era um homem muito reservado e raramente visto em público."Todos sabiam que Brian era recluso. Ele costumava sair tarde da noite e voltar apenas de manhã, quando ainda estava escuro", disse o vereador Paul Gott, da prefeitura local.

Ele afirmou que a morte de Dean poderia servir como um alerta para que as pessoas prestem mais atenção em seus vizinhos."Acho que todos deveriam olhar para sua comunidade e quem faz parte dela e se perguntar se há alguma possibilidade de alguém estar desaparecido", disse Gott."Pode ser intrusivo bater na porta das pessoas e perguntar se está tudo bem, mas é sempre uma boa lembrança", concluiu.

***

Temos a internet para nos conectarmos com o mundo inteiro, acessar infindáveis conhecimentos e conversar com um monte de gente em fóruns, por meio de instant messengers ou sites de relacionamento. Possuímos livros digitais, jornais e revistas segmentadas ab absurdum, além das propagandas de toda sorte que nos bombardeiam com promessas mal cumpridas. Temos centenas de canais de TV a cabo, moramos em condomínios com centenas de pessoas, os passeios públicos e as avenidas estão sempre lotadas, assim como os transportes de massa e até as opções de lazer. Conversamos com tanta gente todos os dias... e, no entanto, não conhecemos ninguém, mal a nós mesmos.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Agonizou no meio do passeio público

Herbert Vianna sempre foi o cara do rock nacional com quem todo mundo sempre pôde se identificar: não era um showman como Bruno Gouveia, não era articulado como Renato Russo, nem bonito como Paulo Ricardo, nem estiloso como Humberto Gessinger, nem sarcástico como Roger Moreira. Era feioso, careca, míope e cantava mal à beça. Paraibano que foi pra Brasília e depois pro Rio de Janeiro, bebum, exagerado nos sentimentos, nem sempre simpático com fãs, imprensas ou colegas de profissão e exímio guitarrista (à custa de muito treino).

Tornou-se frontman da melhor banda brasileira, quiçá da América Latina, de todos os tempos, reconhecida internacionalmente por uma fusão irresistível de rock setentista e ritmos latinos, com o auxílio luxuoso da cozinha cinco-estrelas de Bi Ribeiro e João Barone, além dos já paralâmicos Eduardo Lyra e João Fera, respectivamente na percussão e nos teclados.

Pudemos sempre saber seu estado de espírito: das maluquices juvenis da faculdade de Agronomia em Cinema Mudo, à fossa d’O Passo Do Lui e do período ensolaradamente adulto de Selvagem?, sempre dava pra saber que tudo aquilo era sincero, mas sem a reclusão torturada d’um Renato Russo: a banda sempre fazia shows, as músicas eram sempre um caldeirão de ritmos e as letras não deixavam dúvidas sobre os temas, fossem alegres ou fundo-de-poço.

E foi assim que pudemos acompanhar sua dor-de-cotovelo mais célebre, por causa da Paula Toller, que durou três discos, começando no torturado, confuso e autoproduzido Bora-Bora, passou pelo Big-Bang, auge da fusão de estilos, e terminou no morno (sereno?) Os Grãos.

No Bora-Bora, exceto pelas duas instrumentais (Bundalelê – nome profético – e The Can) e pela versão de Um A Um, de Edgar Ferreira, TODAS aludem ao ocorrido, inclusive citando experiências com cocaína (Don’t Give Me That) e heroína (Uns Dias).

“Descobri mil maneiras de dizer o teu nome com amor, ódio, urgência, ou como se não fosse nada.” (O Beco)

“Te imagino com outro cara numa praia em Bora-Bora agora; me imagino embriagado, jogado no chão d’uma espelunca – nunca.” (Bora-Bora)

“Quem dera eu transformasse solidão em Carnaval.” (Sanfona)

“Será que um dia eu ainda vou ter que me atirar – de uma ponte, aos teus pés, numa curva – ou tanto faz?” (Fingido)

“It makes you walk naked in the pouring rain; and let’s you go crazy to the cross of the trains.” (Don’t Give Me That)

“Às vezes te odeio por quase um Segundo, depois te amo mais.” (Quase Um Segundo)

“Existe uma coisa que me dói perder, existe uma coisa que eu custei a ganhar.” (Dois Elefantes)

“Eu podia ajoelhar, te chamar com toda força; não ia te acordar, não ia ter ninguém, mas eu posso te esperar.” (Três)

“E me deixa tão só, e tá tudo tão quieto.” (Impressão)

“Eu sempre pergunto, você nunca me diz se é assim o amor, sempre por um triz.” (O Fundo Do Coração)

No Big-Bang temos algumas, com as feridas ainda cicatrizando.

“Se você me quer eu te quero, senão eu não me desespero; afinal eu respiro por meus próprios meios; afinal eu vivo enquanto espero.” (Se Você me Quer)

“Outro dia eu apareço; enquanto isso vamos nos entender.” (Esqueça O Que Te Disseram Sobre O Amor)

“Não importa se o que ficou machucou, doeu, nem a porta que se fechou: eu sei que lá, em algum lugar, ficou uma luz acesa no escuro desse amor que se apagou.” (Lá Em Algum Lugar)

N’Os Grãos temos o assunto tratado de forma mais madura e menos rasgada (o próprio Herbert disse que saiu da órbita mesmo, perdeu a cabeça, e levou anos pra poder tratar o assunto de forma racional).

“Eu só queria te dizer que aquela dor já passou.” (Sábado)

“Eu hoje joguei tanta coisa fora... eu vi o meu passado passar por mim: cartas e fotografias, gente que foi embora – a casa fica bem melhor assim.” (Tendo A Lua)

“A vida que eu não tinha ainda agora começou: um outro sonho tanto quanto os que já vivi.” (Os Grãos)

“Você sabe o que eu já fiz e do que eu fui capaz; mas fica tudo entre nós.” (A Outra Rota)

“Passou e eu entendi – como assim? – não vai voltar o tempo, os dias em que tudo ainda estava no lugar; abra os braços, abrace o que sobrar.” (Dai-Nos)

“A dor que vai e vem são remotas sensações longínquas, agora eu lembro bem.” (Trinta Anos)

E foi assim que também acompanhamos seu vexame público d’um bundalelê ébrio numa jam session (musicado em Tribunal De Bar) com os amigos, a maturidade artística (não correspondida pelo mercado), a volta aos hits, a volta às origens, sua agonia pública de perder a esposa e parte do cérebro em um acidente com seu ultraleve (nunca esqueço ele voltando à consciência no hospital, tocando Óculos no violão de náilon, e depois perguntando por que “Deus havia colocado aquela dor tão grande na sua vida”), retornando numa mítica turnê do Longo Caminho (feito antes e lançado após a fatalidade), num clima de celebração e cumplicidade no palco e no público, com lados-B como Selvagem, A Dama E O Vagabundo, Pólvora e Mensagem De Amor (tudo que os “fãs da cadeira de rodas” não queriam).

E mesmo que os shows tenham se tornado um tanto enfadonhos, e o disco Hoje seja o mais morno da carreira da banda, Os Paralamas Do Sucesso são eternos, pela carreira impecável em todos os sentidos. Valeu Barone, Bi e, principalmente, valeu Herbert.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Eternidades da semana

Já o Santos não cansa de fazer papel de ridículo; após a curta festança da geração Robinho + Diego, voltou ao devido lugar, junto com a Portuguesa (Santista?): depois de uma pífia campanha na Libertadores, cambaleia nas últimas posições do Brasileirão. Agora, além de copiar os cânticos corinthianos, como vêm fazendo Brasil afora, resolveram imitar até a estratégia mercadológica; só esqueceram de que o Sardinha FC não tem torcida, e que, portanto, a campanha fajuta vai ser um (merecido) fiasco. Deviam tentar algo mais incisivo.

Kassab, o Santos da política paulista, com seus factóides/pastéis-de-vento e vexames públicos & privados, aprontou mais uma, com seu DataKassab: funcionários das regionais instruídos por e-mail para agir de forma a influenciar as pesquisas do DataFolha, nas quais ele aparece em queda livre. O pior, além do vazamento da mutreta, foi pagar o gorila de aparecer, em mídia impressa nacional, o quanto ele escreve mal.

Assisti aO Banheiro Do Papa, filme uruguaio que corrobora a excelente produção latino-americana dos últimos anos e certifica que nosso cinema continua imbatível na posição de pior do mundo: história criativa, ótimas atuações, trilha sonora consistente, desfecho sólido, enfim, tudo que falta às viúvas do Cinema Novo e aos amadores de tetas globais/rouanetzísticas. Saudade da Boca Do Lixo.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Era feliz: amava o Grande Irmão.

Tem gente que se expõe demais na internet, as vezes sem nem se dar conta do que isso pode acarretar. Não é meu caso: o que as pessoas sabem de mim, via blogs, flog, orkut, twitter e fóruns, não é exatamente o que sou – que mídia haveria de resumir a mim, tão sem-limite? – mas como decido me mostrar em cada espaço virtual: são as máscaras que usamos no dia-a-dia em sociedade. Não que eu encene peças ou incorpore personagens, apenas protejo minha privacidade (o que interessa dela) e a das pessoas que me rodeiam. Qualquer pessoa que pesquisar sobre mim na web vai descobrir que escrevo, que toco, que sou ansioso, insone, cervejeiro, cinéfilo, que tenho namorada, que moro na Zona Oeste de São Paulo, que adoro gatos, que sou corinthiano, que jogo truco-sinuca-boliche, que leio além da conta... nenhum segredo. Por isso a recente repercussão de quando fui citado num artigo do IDG Now!, que alcançou boa visibilidade por ter sido numa matéria sobre a "queda" d'orkut na segunda-feira e de o link (clique no título deste post) ter aparecido na capa do portal do Uol, não me causou nenhuma reação além do sorriso de quem foi cappturado em polaróide num momento de humor e sarcasmo. Quem quiser privacidade, proteja-se; quem tiver o que esconder, fique esperto ou saia da internet.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

A bola da vez

Sábado o Corinthians, atendendo aos pedidos de uns 170.000.000 de brasileiros, que eram todos torcedores do Bahia, perdeu a primeira partida na Segundona. Engraçado como o Timão desperta sentimentos intensos tanto nos torcedores quanto nos detratores... o fato é que ninguém fica imune a esse time-nação. Sabadão de tarde e a Globo passando jogo da série B... quando isso aconteceu antes? Grêmio (duas vezes), Palmeiras, São Paulo (numa virada de mesa que permitiu que um time rebaixado no PAULISTÃO de 1990 disputasse a Segundinha em 1991 e voltasse no mesmo ano, disputando a final contra o Corinthians levando vantagem de resultados iguais por uma campanha melhor no campeonato mais fraco... coisas do futeco brasileiro), Fluminense (duas vezes pra Segundona e uma pra Terceirona!), Atlético Mineiro, qual desses times teve destaque na mídia quando caiu? Quanto ao jogo, foi naturalmente feio, como todos de um campeonato de nível tão baixo, e mais ainda porque o péssimo Bahia veio para não jogar, achou um gol antes dos 10min de jogo, num frango do Felipe, e praticou o antijogo desde então, fazendo um quase cai-cai e abusando da violência. Some-se isso às limitações do elenco corinthiano (sai Chicão, entra o bebum Fábio Ferreira!), dependendo do fraco Acosta e do apenas esforçado Herrera, e lá se foi a nossa virgindade. Bom, pelo menos acaba essa encheção: o campeonato vai até dezembro, seria impossível ganhar o certame invicto Até o próximo jogo. Timão eô!

Falando em rebaixamento: quando o Palmeiras caiu, a torcida apoiou, cresceu, e os jogos passavam de sábado à noite na Gazeta ou Rede TV!, não lembro; se o São Paulo caísse mesmo (sem virada de mesa), os estádios esvaziariam, pois são-paulino só vai ao estádio quando é jogo ganho, mas a Globo provavelmente se interessaria (aberto o precedente corinthiano), pois há muitos torcedores do São Paulo na cidade homônima; já o Santos, se cai (está indo a passos largos para esse destino), como não tem história além da década de 1960, como não tem torcida, como não desperta interesse (nem amor, nem ódio, nem desprezo), não passando de um bando de chorões passadistas, vai ficar que nem a Portuguesa, levando uns cinco ou seis anos pra subir novamente à elite, e terá seus jogos transmitidos – em VT, gravados por algum torcedor de forma amadora –, na madrugada de terça pra quarta, na Rede Vida, com comentários de algum noviço nada rebelde.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Om Hundrede Aar Er Alting Glemt.

Conversando com um amigo, que, aliás, já havia conversado sobre isso com um colega de trabalho, e ouvindo a canção que dá nome ao post (nunca esqueçam de que o título sempre é um link pra alguma coisa interessante), resolvi escrever: quanto tempo leva para uma pessoa ser completamente esquecida, desaparecendo por completo das memórias e dos registros oficiais e oficiosos?

Muita gente se preocupa com o os rastros virtuais, no melhor estilo Igreja Triangular Do Resíduo Digital, do maluco-e-picareta-de-plantão Miranda, outrora músico (ruim) sulista, depois jornalista, depois produtor, depois colunista da saudosa e caótica revista General (quando apareceu com essa piada de igreja, que muita gente levou a sério, na qual os resíduos digitais da pessoa poderiam ser usados para ressuscitá-la, ou coisa assim) e hoje jurado do Ídolos.

Certos rastros digitais, como e-mail, MSN, Skype e Twitter dependem da ação direta do usuário para funcionar. Outros, como blogs e fotologs, podem resistir mais, porém, correm o risco de ser deletados por falta de uso e/ou quando a moda passar.

Restam um pouco mais as mensagens e os profiles em fóruns e orkuts/similares. Eu mesmo participo de um fórum com uma área específica para os foristas falecidos serem homenageados. Há gente que guarda e-mails em CDs de arquivo, anos a fio, além de sites que fazem isso periodicamente na internet, como os serviços que fazem backups constantes da rede.

Portanto nossos podres devem durar digitalmente mais do que durariam em anotações de diários ou na mente de contadores de histórias (claro que estou falando de anônimos, pessoas não famosas), além de registros governamentais, que de tão desorganizados podem-se considerar perdidos.

Já pensou um serviço funerário na web, para sepultar seus registros digitais? Assim aqueles podres registrados em comunidades constrangedoras, e-mails queima-filme e deleção de profiles a fim de que o pessoal do Profiles De Gente Morta e seus parentes fiquem lhe deixando scraps, sendo que nem sabe-se como é o além-web.

Mas, se por um lado, o acesso à informação está mais fácil, também é volátil demais: sites, provedores e contas, tudo é encerrado a todo momento, gerando um monte de fantasmagorias como links quebrados, arquivos órfãos e endereços incorretos.

E alguém irá consultar tais arquivos após algumas gerações? Ou será como é atualmente, quando em mais ou menos um século ninguém mais se lembra de você (dependendo da idade com a qual você morreu e seus descendentes mais novos nasceram)?

Então faz sentido deixar ou não um legado? Faz diferença deixar uma incrível obra de arte, um monte de filhos bem criados ou um grande e luxuoso túmulo? Sendo no início, no meio ou no fim da vida, não seria tudo isso apenas resistência em admitir a gratuidade e a finitude da existência? Assim como a crença em deuses, destino e vida após a morte, deixar algo que será visto por gerações futuras, quando você mesmo não poderá conferir nada disso, tem alguma utilidade? Ou toda atitude, disfarçada de projeto de vida, resume-se a um passatempo até a hora da morte?

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Divagações filosóficas II

O homem é uma existência que busca a consciência de si. Assim o em-si = objeto e o para-si = sujeito = consciência irrefletida. Quando esta torna-se reflexiva, o para-si passa a ser-para-o-mundo, interagindo com outros seres-para-mundo (ser-com). Tentamos fazê-los objetos e eles também tentam nos fazer voltar ao em-si. Por isso, mais importante que os objetos e a consciência, é a união desses dois – como a consciência interage com o mundo, com todas as coisas. Por isso, nessa parte, o cogito cartesiano continua válido, trazendo solidão, vazio e angústia, porém sem o término em Deus no qual ele cria.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Divagações filosóficas

Sartre criticava o "mundo como representação" de Schopenhauer, além dos racionalistas que reduziam os objetos a conteúdos de percepção dos estados da consciência. Com base na fenomenologia de Husserl, Sartre postulou que nada existe a priori na consciência, uma vez que esta só possui conteúdos de pensamento: a consciência só existe quando vai ao encontro do mundo. Em-si, ela não é nada, só existindo quando tenta fugir dela-mesma, em direção ao objeto. N'A Transcendência Do Ego, Sartre disse: "O ego não está na consciência, nem formal, nem materialmente; ele está fora, no mundo; é um ser-para-o-mundo, assim como o ego de outrem". Portanto sujeito + objeto = existência; em-si/para-si = dimensão "cristalizada" da consciência; consciência = consciência de si = ser-para-o-mundo. Assim, a presença de outra consciência limita a liberdade.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Nihil ex-nihilo

Com base em um debate na internet sobre niilismo, acabei colando algumas coisas que disse lá e montando este arremedo de texto com mais algumas informações. O objetivo é mostrar que o niilismo como filosofia é impossível, sendo um auto-engano ou, no máximo, uma fase pela qual (quase) todos passam na existência.

Bom, excluindo Deus da teoria, visto que um verdadeiro niilismo prescindiria uma recompensa além-túmulo, além de qualquer propósito em existirmos, temos:

_Sartre: arte e ética dando sentido à vida. Acho O Existencialismo É Um Humanismo, conferência que virou panfleto, um bom texto introdutório sobre o existencialismo. O problema é ficar só nisso, visto que ele é uma tentativa de diluição de um pensamento bem esquematizado n'O Ser E O Nada (um dos livros mais discutidos e menos lidos) – e lá há um bom esquema de doação de sentido para a existência, negando qualquer niilismo. Já esse negócio do ser-para-a-morte ele pegou do Heidegger, que pegou do Schopenhauer, que pegou do hinduísmo. E eu discordo do niilismo pelo viés existencialista, que o Camus tanto criticou n'O Homem Revoltado. O niilismo do Nietzsche, por exemplo (O Eterno Retorno), destrói os valores vigentes para então construir os próprios.

_Camus: a vida é a vida em-si. Camus, em O Mito De Sísifo, diferencia com veemência "a opinião que se tem sobre a vida e o gesto que se faz para abandoná-la. Negar sentido à vida não significa, necessariamente, que vale a pena encerrá-la. Ele também faz uma bela síntese do niilismo nietzschiano em O Homem Revoltado. Camus critica tanto a fuga pela arte porque acha que o homem absurdo pode usar essas coisas com sintomas do absurdo, e não como sentido pra vida. No entanto ninguém discorda que a ética é resultado do convívio em sociedade, etc. O niilismo ideal e o Schopenhauer eu coloco no mesmo balaio inviável, como se buscassem um conforto na tristeza ("Ah, é assim mesmo!”). Portanto, nesse ponto, fico com o Sísifo camusiano: já que eu não consigo me matar, uma vez que meu instinto de preservação não permite (o que mostra sanidade), minha empatia pensa no sofrimento que isso causaria a quem gosta de mim, e como eu não fiz nada na vida até hoje além de viver, e não sei ser estar morto é melhor que estar vivo (viver toma todo meu tempo), vamos fazer isso da melhor forma possível. Em resumo, não acho que a vida é bela por causa da finitude, mas que ela PODE ser bela APESAR da finitude.

_Schopenhauer: o sofrimento é a medida da vida. No volume 3 d'O Mundo Como Vontade E Representação, a fuga do "pêndulo que oscila entre o tédio e a dor" é o ascetismo da contemplação desinteressada das coisas-mesmas, por meio da arte e da aceitação do sofrimento e da gratuidade. Sim, ele surgiu com a pretensão de ser um consolador para os males da própria existência, mas nem de longe é uma rasa auto-ajuda. O paço não fica nem um pouco menos pedregoso pela opção da renúncia e pela conduta estóica; nunca foi muito divertida uma mortificação sem promessas de compensação póstuma.

_Nietzsche: esse ascetismo é tomado por na Genealogia Da Moral, que propõe essa conduta para negar a moral cristã, moral de escravos, de valores tacanhos. O Bigode "tem um desejo de ser outro, de estar em outro lugar". No mesmo livro ele já diz que o niilismo é uma crise de valores, a grande doença de sua época, advinda de uma herança de animal domesticado, antes livre e naquele momento sujeito a regras, culpas e punições. Assim que sai perdendo nessa civilização falida tende a perder o interesse nela. Chegamos, então, a um ponto em que concordamos todos: a negação da vida exigida do asceta é sim uma forma de afirmação de um modo alternativo de vida, imposto em sua valoração. Já o além-do-homem, iniciado n'O Anticristo e delineado em Assim Falava Zaratustra, configura afirmar a vida sem a necessidade de qualquer negação, criando valores "além do bem e do mal". Era o eterno retorno... "e a vontade-mesma estava salva".

Um sujeito sem valores é um ser completo ou só um display de papelão? Se ele nega todos os valores e não coloca nada no lugar, o que o diferencia de um ser-em-si, de uma pedra falante?

Vamos organizar.
1. Pode existir um niilismo sem que nada seja colocado no lugar?
2. Se sim, esse nada não seria um crença também, um valor?
3. Se não, por que esse FDP não se mata logo e pára de encher o saco?

O niilismo ideal-impossível (sim, estou roubando meio-termo da semiótica) é inviável, pois a negação de tudo acaba tudificando (parodiando Sartre) o nada. E isso o véio vesgo já tinha dito, que existir já é estar engajado, não escolher já é uma escolha. Portanto eu, e acho que o autor também vê assim, vejo o niilismo apenas destrutivo como fraqueza mesmo. Melhor limpar a bagunça e construir algo legal depois que tiver botado tudo no chão. É por isso que os gregos ainda são os caras, desde as teogonias, e logo depois, os pré-socráticos. The same old haunts, the same old fears. Nossas angústias são as mesmas desde sempre, e jamais cessarão. Todas as filosofias, fantasmagorias, crendices, nada disso passa de bandeide metafísico. Acho que se houvesse niilismo mesmo, o "ideal", não saberíamos dele, visto que todos os adeptos cometeriam suicídio antes de escrever algo sobre. Portanto cala a boca Sísifo! Carrega a pedra.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Eternidades da semana

Esconder as cinzas sob o tapete
Nada de muito novo no front: Falha de S.Paulo se fazendo de desentendida e jogando lá pro final do primeiro caderno as escandalosas (nunca vai terminar esse assalto?) desapropriações para a construção do Roubanel tucano; O Estrago de São Paulo dizendo ter sido combativo na época da Ditadura (só se foi combativo à democracia), enquanto que o famoso editorial “Basta!” é simplesmente jogado sob o tapete, com as cinzas. O mesmo para as leis já existentes para o controle dos motoristas embriagados: esqueçamos as antigas, que já não fazíamos cumprir, criamos novas, mais duras, pra fingir ação veemente, estimulamos um debate inócuo na mídia por umas duas semanas e tudo volta ao normal, com carteiradas, suborno e nenhum respeito à civilidade. E gente que nunca morreu vai continuar morrendo.

Bagaceira sincera
Saudade do Notícias Populares, NP para os íntimos. Bagaça mesmo, mundo-cão e diversão, sangue-suor-e-lágrimas (estas, às vezes, de tanto rir), com direito a diagramação podreira, textos podreira e manchetes podreira. Nada da falsa indignação dos datenas e rezendes da vida, mas tão-somente a bizarrice e a grotesquidão inerentes à natureza – e à curiosidade – humana, daquela mais mórbida, de parar pra ver acidentes, ver filmes gore ou sites com fotos splatter. Sempre uso com exemplo uma manchete que saiu quando do namoro do Rafael Pilha com a Cristiana Oliveira: JUMA SÓ GOZA COM O POLEGAR. Pena que não tive o insight de comprar aquele jornal... valeria uma grana (ou pelo menos boas risadas) hoje. E pra quem costuma me questionar quando afirmo que foi o NP que inventou a saga da Loira do Banheiro, eis aqui, aqui e aqui. Volta NP!

Você foi mó rata comigo
E-rato: traído pela memória (e estimulado pela preguiça), outro dia, falando sobre trânsito, creditei ao Laerte uma história (A Revolta Das Kombis) que era do Spacca e saiu na Níquel Náusea nº5 (julho de 1989). Fui mó rato com o cara.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Faça uma lista de grandes motivos pelos quais Fagner já foi vanguardista e quem fala mal não sabe nada de nada.

[Onze em vez dos habituais dez, só pra contrariar]

01. Teve discos produzidos e arranjados por Hermeto Pascoal, com direito até a uma canção em parceria.

02. Gravou na Espanha, em 1982, um disco sobre Pablo Picasso.

03. Fez a ponte musical Ceará–Espanha, confirmando a influência na música nordestina, como disse João Cabral de Melo Neto quando foi embaixador brasleiro em Sevilha.

05. Musicou poemas de Cecília Meireles, Florbela Espanca, Mário de Andrade e Ferreira Gullar.

06. Gravou compositores do Nordeste como Clodo & Clésio, Gordurinha e Patativa do Assaré.

07. Gravou as melhores versões de Sinal Fechado (Paulinho da Viola) e As Rosas Não Falam (Cartola), segundo seus autores.

08. Esteve sempre antenado com o melhor de cada época para seus discos, como Vímana, Roupa Nova (antes da fama), Banda Black Rio, Chico Buarque, Wagner Tiso, Ivan Lins, João Donato e Roberto Menescal.

09. Elis Regina literalmente correu atrás dele pra conhecer aquele cearense de quem ela havia ouvido uma demo e da qual estava cantando quatro canções nos seus shows.

10. Foi convidado para gravar um disco produzido por George Martin, o que só não aconteceu por incompatibilidade de agendas.

11. A culpa pra isso acabar foi do Roberto Carlos, que lhe disse, no começo dos 1980s, para deixar de fazer “música para universitário” e compor algo “pro povo cantar junto”.

sábado, 21 de junho de 2008

Faça uma lista de grandes músicas do Elton John

01. Benny And The Jets
02. Funeral For A Friend / Love Lies Bleeding
03. Goodbye Yellow-Brick Road
04. I Need You To Turn
05. Madman Across The Water
06. Rotten Peaches
07. This Song Has No Title
08. Ticking
09. Val-Hala
10. Your Song

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Here today

Assim como há pessoas que entram da nossa vida e dela saem sem deixar mais do que pálidos vestígios, há personagens que, mesmo que nem os tenhamos conhecido, mesmo que nem tenham existido realmente. Assim como esses dias houve o aniversário do Paul McCartney e a notícia de que o Martin Scorsese vai fazer um documentário sobre o George Harrison, além de hoje meu personagem preferido de todos os tempos, Garfield, fazer aniversário, há pessoas que, longe de serem celebridades, têm importância artística, até filosófica, para nossa existência. Assim como o tio suicida que me legou discos que fizeram minha infância um oceano de melodias sessentistas e setentistas, esta semana foi aniversário de uma pessoa que, embora tenha morrido há muito, e eu só tenha conhecido por poucas fotos, sei-o muito pelas histórias encantadoras que me contam dele e pelo que ele deixou neste mundo como legado. Sei que torceu para um grande time (ganha pontos), que tinha um caráter irreprensível, que curtia um goró de vez em sempre (ganha mais pontos) e teve que enfrentar barras mais duras do que as que passei na última meia-década. Sei que morto sempre vira santo, mas, se ele deixou de herança alguém tão perfeito, por que não acreditar que tudo isso de mágico veio um tanto dele? Sei que você não vai poder ler isto, pois há muito já voltou à terra úmida aonde todos vão descansar; mas gosto de pensar que teus átomos estão por aí, espalhados, compondo novas formas, as mesmas partículas que correram infinitos desde o início do Universo, até você. Abrazzos!

Salve a seleção.

[10h15min]

Após um sofrível empate sem gols contra a Argentina, no Meineirão, a seleção brasileira de futebol, que deixou o campo sob vaias e gritos de "burro" (depois reclamam que só os paulistas vaiam e xingam a selecinha) e hoje cairá pra quinto na tabela (sendo ultrapassada por Chile ou Venezuela), volto a questionar, aqui, enquanto visto minha camisa da seleção hermana: por que as pessoas sentem-se obrigadas, e querem obrigar os outros, a torcer pelo Brasil nos esportes, especialmente no futebol?

Sinto-me no dever de torcer para que o país vá bem na economia, na saúde, na educação... quanto ao futebol, embora eu seja entusiasta do esporte (talvez por isso mesmo), a selecinha não me interessa nem um pouco desde 1990, acho, com o advento do futebol feio na pior de todas as copas (e a única que acompanhei vendo TODOS os jogos de todos os times e fazendo recortes de jornal para montar numa pasta).

Não tenho orgulho de ser brasileiro, assim como não tenho vergonha; afinal é uma facticidade, algo que não escolhi, é como ter o ridículo orgulho de ser branco/negro, homem/mulher, etc. Portanto me reservo o direito de torcer pela selecinha quando esta fizer jus, coisa que não acontece desde 1986, provavelmente.

Sem falar que a coisa piorou desde a injeção de dólares que leva nossos boleiros e nem-tão-boleiros-assim; até, vá lá, a Copa de 1994, você ainda via discussões na rua, nos bares, nas casas, nos programas de TV e rádio, sobre quem deveria ou não ser convocado. Hoje a coisa é tão pasteurizada, com jovens jogadores que saem cedo daqui e vão "brilhar" no incrível futebol do Leste Europeu ou do Oriente Médio, que me pego pensando "Quem são esses caras?". Nem dá mais pra saber se o cara está realmente bem, a não ser que você acompanhe o futebol turco, o croata, o português... sem falar que ser ídolo em países de pernas-de-pau como a Alemanha não é exatamente mérito, mas obrigação.

Ontem Dunga, que jogou feio nos clubes, jogou feio com Parreira, faz o que melhor aprendeu nesses anos: pegou um amontoado de cabeças-de-bagre, sem esquema tático algum, batendo, espancando, mutilando, e chutando bolas quadradas para os atacantes se virarem no individualismo. E ainda responde às críticas com a arrogância que só vencedores como Luxemburgo, Felipão e Muricy podem ter.

Ah, como eu queria que o Brasil não fosse a Copa!... Seria divertidíssimo ver o chororô da imprensa. E não, eu também não estou nem aí com as Olimpíadas, acho um absurdo levarmos uma comitiva com centenas de atletas, como se fôssemos uma potência esportiva, sendo que vai ser, como de praxe, coco atrás de coco. Deveríamos aceitar nosso lugar e fazer como os países mais sensatos, que levam só grupos de esportes nos quais têm chance. Poupa dinheiro público e poupa o público de (mais) vexame.

[10h28min]

sábado, 14 de junho de 2008

Hoje eu vendo sonhos.

Eu não achava a vida chata, pelo menos que eu me lembre, e nem que a vida devesse ser assim. Na minha cabeça alternaram-se sonhos, planos e desejos, alguns executados, outros abandonados no meio do caminho, uns outros tantos sequer iniciados.

Desenhista de HQs, músico, arqueólogo-historiador-geógrafo, jogador de futebol, jornalista, escritor... que eu me lembre, esses foram os principais.

Eu queria tudo isso meio que ao mesmo tempo, em constante alternância, pra ser mais específico, e treinava/estudava com o maior afinco, porém sem a menor noção ou orientação; tudo era intenso e verdadeiro, mas pueril de tão lúdico.

Acabou que eu eu fiz um pouco de quase tudo, sei um tanto de um monte de coisas, mas me tornei alguém indefinível, e nem sei aonde ir.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Factus de matéria, cinis elementi.

"'Não posso convencer-me', escreveu Darwin, 'de que um Deus benéfico e onipotente tenha criado propositalmente as Ichneumonidae com a intenção expressa de que estas buscassem o seu alimento no interior do corpo vivo das lagartas'. Na verdade, a perda gradual da fé por parte de Darwin, que ele dissimulava com medo de aborrecer sua devota esposa Emma, tinha causas mais complexas. Sua referência às Ichneumonidae era aforística. Os hábitos macabros aos quais ele se referiu são compartilhados por suas primas, as vespas cavadoras, as quais encontramos no capítulo anterior. A fêmea da vespa cavadora não apenas põe seus ovos numa lagarta (ou gafanhoto ou abelha) para que suas larvas alimentem-se de seu corpo, mas, de acordo com Fabre e outros, ela cuidadosamente dirige seu ferrão para cada um dos gânglios do sistema nervoso central da presa, de modo a paralisá-la mas não matá-la. Deste modo, a carne mantém-se fresca. Não se sabe se a paralisia funciona como uma anestesia geral ou se ela funciona como o curare que simplesmente suprime a habilidade que a vítima tem de mover-se. Se este for o caso, a presa pode estar consciente de estar sendo comida viva a partir de seu interior, mas é incapaz de mover um músculo para fazer qualquer coisa a respeito. Isto parece selvagemente cruel mas, como veremos, a natureza não é cruel, apenas implacavelmente indiferente. Esta é uma das lições mais duras que os humanos têm de aprender. Não podemos admitir que as coisas possam ser nem boas nem más, nem cruéis nem carinhosas, mas simplesmente cruas – indiferentes a todos os sofrimentos e sem nenhum propósito."

(Richard Dawkins, O Rio Que Saía Do Éden.)

***

Foi exatamente nesse texto que pensei quando, no início desta semana, uma médica do SUSto, no meio da consulta, em uma conversa off-topic, quis me demover do ateísmo com base em que “tudo é divino, maravilhoso e, portanto, não pode ser obra do acaso”. Sim, a tal “complexidade irredutível” que os criacionistas disfarçam de ciência com o tal design inteligente (pfff). Pensei em Darwin, Dawkins, nas vespas-cavadoras, até em crianças com paralisia cerebral. Mas fiz cara de tolerante e fui que fui (aliás, fiquei que fiquei). Não tenho como trocar de médico porque o SUSto te desencaminha de acordo com a região – e minha região sequer tem esse especialidade, eu sou deslocado para outra região.

Vida de ateu não é fácil.

_Como você pode achar que a vida é só isso? Não pode ser?

_E você vive assim, sem sentido?

_Você é tão inteligente... por que é ateu?

_Você é uma pessoa tão boa, como pode ser ateu?

_Ah, você não é ateu de verdade... lê a Bíblia, freqüenta fóruns de religião, carrega de simbologia religiosa seus textos...

_Você é crente sim, só não descobriu ainda.

_Você substitui Deus pela crença nesse Sartre aí, nesse Camus. Ateísmo é uma crença. [N.: tanto quanto “careca” é uma cor de cabelo.]

E por aí vai. As pessoas sequer entendem o que é ateísmo, como poderiam respeitá-lo? Parece ofensa, mas é só ignorância mesmo.

Então, primeiro, um desabafo/recado: não me venham com sentido da vida, busca pelo sagrado, complexidade irredutível ou qualquer coisa do gênero. Existe admiração com ceticismo, assim como espiritualidade e ética sem religião. E nenhum sistema filosófico serve de muleta como as religiões.

Antes mesmo do episódio da médica, um dia eu até me peguei pensando, ao contrário de outros tempos, quando eu avisava, a quem estivesse ingressando, que não era fácil, uma quase-felicidade por ser ateu e materialista. Sim, porque a angústia existencial é também dolorosamente fascinante, toda a magnífica gratuidade, o esplendor das sem-razões do Universo, o fato de sermos todos feito da mesma poeira cósmica, das mesmas partículas que fervilharam no núcleo de estrelas iridescentes no big-bang. Sim, ver beleza no caminho cheio de flores, pedras e descaminhos, na poética aridez da desesperança que jamais vira desespero; a liberdade de ser e de estar, de fazer o certo por achar certo e saber que é certo, não esperar aprovação de códigos morais canônicos nem recompensas “extracampo”. Sim, descobri que gosto de ser quem sou. Afinal escolhi ser assim. Ateu praticante ocidental. Quem preferir crer sem nenhuma transcendência, simplesmente por parecer mais cômodo, que permaneça no auto-engano. Não questiono nem discuto experiências de religiosidade, mas condeno e lamento por quem procura justificar a fé unicamente pelo medo e/ou pela comodidade do wishful thinking.

“Vivemos com o baralho viciado contra nós e depois morremos: é só isso? Nada a não ser um sono sem sonhos e sem fim? Onde é que está a justiça nisso tudo? É desolador, brutal, impiedoso. Não deveríamos ter uma segunda chance numa arena nivelada? Como seria melhor se nascêssemos de novo em circunstâncias que levassem em conta o nosso desempenho na última vida, por mais viciado que o baralho tivesse estado contra nós. Ou, se houvesse um julgamento depois da morte, então desde que representássemos bem as personalidades que nos foram dadas nesta vida, e fôssemos humildes, fiéis e tudo o mais – deveríamos ser recompensados vivendo alegremente até o fim dos tempos num refúgio permanente, longe da agonia e do turbilhão do mundo. Assim seria, se o mundo fosse ideado, pré-planejado, justo. Assim seria, se os que sofrem com a dor e o tormento recebessem o consolo que merecem. Dessa forma, as sociedades que ensinam a satisfação com o que temos na vida, na expectativa de uma recompensa post-mortem, tendem a se vacinar contra a revolução. Além disso, o medo da morte, que favorece sob alguns aspectos a adaptação na luta evolutiva pela existência, prejudica a adaptação em tempos de guerra. As culturas que falam de uma futura vida de recompensas para os heróis – ou até para aqueles que apenas cumpriram as ordens das autoridades – podem levar vantagem na luta. Assim, a idéia de que uma parte espiritual de nossa natureza sobrevive à morte, a noção de uma vida após a morte, deve ser algo que as religiões e as nações não encontram dificuldade em vender. Podemos antever que não será muito difundido o ceticismo a respeito dessa questão. As pessoas vão querer acreditar na vida após a morte, mesmo que a evidência seja escassa e até nula.”

(Carl Sagan, O Mundo Assombrado Pelos Demônios)

terça-feira, 3 de junho de 2008

Do latim pré-clássico Magnas (um grande homem), do latim clássico Magnus (grande)

Fábio
10:06 am (2½ hours ago)


Isto deveria estar no tópico "confessionário", mas vá lá: ontem, na madruga, vi, num piratão de 5 pila, O Magnata.

Prontofalei.

Ela não quer me dar
Ela não quer me dar
Então enfia essa buceta no cu
Enfia essa buceta no cu


***

Marcus
10:15 am (2 hours ago)


Diz que presta, isso.
Confere?

***

Fábio
10:36 am (2 hours ago)


Olha, tecnicamente é impecável, apesar de clichê; uma boa grana deve ter sido gasta.

O Paulinho Vilhena no papel dele mesmo, como sempre, então fica direitinho também. Idem pro Chorão (ele mesmo) e pro Marcelo Nova (grilo-falante). As atuações das minas, que tiveram que atuar mesmo, são horríveis.

As cenas de sk8 são bem paia – Chorão já foi um bom skatista, mas hoje, com aquela banha, só com dublê –, assim como as de surfe (tudo figurante).

A história é pífia e o filme tem aquele clima malaco paulista d'O Invasor, só que sem o show que o Paulo Miklos deu, né (sem contar no resto do elenco, com atores de verdade). Até o tom esverdeado da fotografia evoca esse filme.

Te falar que deu pra divertir, viu. Tá certo que tem as músicas de auto-ajuda do CBJr. aqui e ali, e o filme, como fica claro no final, se propõe a ser sério – o que deixa a coisa toda ainda mais involuntariamente engraçada.

Ah, e esqueci dos coadjuvantes: João Gordo e Marcos Mion no papel deles mesmos (babacas) e, vestido de Elvis-Gordo-Cantor-De-Puteiro, o inefável... TIRIRICA! [Morri.]

Enfim, valeu os cinco pila. Recomendo ver com a galera, com muita cerveja, cascando o bico.

[Não acredito que acabei de fazer uma análise do filme do Chorão.]

***

Marcus
10:39 am (2 hours ago)


Pois é, achei que iam ser umas duas linhas... tipo, gostei / não gostei.
Valeu por me deixar testemunhar o mico

***

Fábio
10:46 am (1½ hours ago)


Estou arruinado.

Ah, já fudeu tudo mesmo, lembrei de mais umas coisas:

- a fotografia esverdeada parece também com aqueles filmes de terror dos 1990s, como Re-Animator, Príncipe Das Sombras e Dois Olhos Satânicos;

- O Tiririca Elvis-Gordo-De-Puteiro tem uma camisa escrito "hardcore" com a mesma fonte do AC/DC;

- tem uma mina gostosinha e aparecem uns peitinhos de leve (o público-alvo do filme já vai descascar uma nessa cena);

– tem um mano com saxofone numa rodinha de violão na praia;

[No meio do filme, lá pra 1h20min da madrugada, comecei a ler o problema metafísico-ontológico de Parmênides quanto à existência do ser e da natureza. "Não há nada que impeça o ser de alcançar a si mesmo".]

- "enfia essa buceta no cu" já entrou pro meu repertório de ofensas.

sábado, 31 de maio de 2008

Chesnut Tree

O castanheiro de Winston é o mesmo de Roquentin. Ambos revelam a revelação terrível da ruína e da traição das crenças outrora inabaláveis.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Bingo deprê

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depressão | ansiedade | pesar | abandono |
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angústia | desespero | dor | desânimo |
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tristeza | pânico | sofrimento | desamparo |
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suicídio | angústia | agonia | desistência |
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Imprima a cartela acima e passe aos seus amiguinhos de trabalho.

Cada um vai completando com os sentimentos durante o dia.

Quem completar grita bingo! e comete suicídio.

Divirta-se.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Sei que às vezes uso palavras repetidas.

"Por favor, o que falta para o mundo acordar em relação a tudo? Acordem! Acordem! Acordem! A evolução científica é barrada pela ignorância religiosa, a evolução do Brasil é barrada pela vagabundagem universal. Nas escolas ninguém quer ensinar e ninguém quer aprender. Ninguém quer ler um livro, ninguém gosta de ter que pensar... é o FIM.

As notícias me envergonham, os desocupados de corpo e alma querem linchamento público, pedem a proibiçao do aborto e depois a pena de morte para os sobreviventes ao aborto. O mundo está ao contrário e quase ninguém reparou. Guerra para quem não precisa de guerra e paz para os que precisam de uma sacudida geral?"

domingo, 11 de maio de 2008

Se duvidar, eu tenho mais de um mar de provas.

Ruim não foi, longe disso. Um show que abre com Mil Acasos não pode ser ruim. Um show que tem Dois Rios, Canção Noturna e Zé Trindade não pode ser ruim. Um show que fecha com Tão Seu não pode ser ruim. Tudo tocado com extrema competência, total entrosamento e nenhuma má-vontade. E o público ainda estava surpreendentemente comportado para uma apresentação gratuita – sem falar que a cervejinha e as boas companhias garantiriam a diversão, mesmo naquele fim-de-mundo que é São Bernardo do Campo –, então qual foi o problema?

Samuel é um excelente compositor, um frontman razoável, uma ótima voz, que nunca falha, mesmo nas canções com notas altas – ainda que em Dois Rios a terça abaixo em relação ao disco deixe a música caidaça –, mas sua egotrip de guitar hero já encheu o saco, e não é de hoje. Ele não é virtuoso, não é a dele, nem são suas influências. Aqueles interlúdios com solos bobos, ligados de três notas e riffs desconexos, que em nada se conectam com as músicas que vêm as seguir – me senti ouvindo os interlúdios renascentistas dos discos do Rhapsody (Of Fire). E ainda ontem houve até vinhetas de teclado.

Sem falar que – e agora chegamos ao grande problema – a falta de culhões, a bunda-molice, o acomodamento da banda ao vivo chega a ser irritante. A abertura, com o tema de Três Homens Em Conflito (filme de Sergio Leone, trilha de Ennio Morricone), além de ser chupinhação do Metallica, que usa outro tema do mesmo filme, não muda desde o Cosmotron (2003). As vinhetinhas guitarrísticas de Três Lados e Uma Partida De Futebol são da época do MTV Ao Vivo (2001). E o repertório praticamente não muda, parece que eles realmente querem ser uma banda genérica, sem fãs de verdade, apenas com um público “baladeiro”, porque é difícil de aturar sempre a mesma coisa, aquele lance sem surpresas: você já sabe exatamente o que vai e o que não vai ouvir, não tem aquela expectativa de “será que vai rolar um lado B?”, pois isso nunca acontece. E não é porque ontem foi um show de graça, patrocinado pela Toyota, portanto atípico, etc. Essa postura se mantém até em abertura de turnê. Ontem foi o cúmulo: um show só com DUAS músicas do Carrossel (2006), o disco mais recente.

Tocar covers, quando relevantes, também é legal: mesmo a toque de caixa, visto que é o mesmo arranjo de Canção Noturna, a versão de Vamos Fugir, do Gil, salvou a canção; e a de Beleza Pura, do Caê, além de ter ficado com a cara da banda (incluindo a malandra e manjadíssima cozinha de Taxman, dos Beatles), tornou uma música chatíssima algo agradável. Mas ontem, além dessas duas, ouve uma totalmente dispensável cover de Loirinha Bombril, d'Os Paralamas, que, por sua vez, além de ser muito chata, é versão de Parate Y Mira, do Los Pericos. Ou seja: se fossem homenagear a banda – o que já é estranho, já que, embora fosse uma óbvia influência tanto na sonoridade geral da banda quanto na guitarra do Samuel (Samuel influenciado por Herbert, influenciado por Lulu), era sempre negada nas entrevistas –, que escolhessem uma das tantas canções maravilhosas da melhor banda brasileira de todos os tempos.

E até quando eles vão insistir (eles, já tiozões tocando de terno – sério!) nas early songs? Pra que ficar insistindo em Jackie Tequila, Pacato Cidadão, Garota Nacional e Esmola, se já há hits do mesmo calibre na fase adulta, como as recepções calorosas a, por exemplo, Vou Deixar e Acima Do Sol, provam isso?

Eles já demoraram para ousar no estúdio: a desprodução de Dudu Marote no Calango (1994) já foi um passo atrás do epônimo, de 1993. O Samba Poconé continuou sem muitas inovações. Mesmo com o jogo mais que ganho, milhões e cópias vendidas graças à chuva de hits e o mercado em chamas por causa da fase idílica do Plano Real, o disco Siderado (1998) – o primeiro com uma produção decente, a cargo de Paul Ralphes, o mesmo do excelente Escuta Aqui (1999), do Biquíni Cavadão – ousou pouco, com Resposta e No Meio Do Mar, pois o resto é mais do mesmo. Só em Maquinarama (2000) a carroça começou a andar de verdade, e eles começaram a virar a banda incrível que são hoje.

Então é praticamente obrigação artística deles, após tanto dinheiro e sucesso, com tudo extremamente consolidado em mais de 15 anos de carreira, de três excelentes discos adultos debaixo do braço, começarem a se impor perante o público.

Eles não são a melhor banda do país – o trono ainda é do Pato Fu, pela extrema coragem e pelo talento ímpar –, justamente por esse medo de arriscar. E eu digo isso com a certeza de quem era o único lá, ontem, a comprar os discos na época, desde o primeiro, e ver shows deles há mais de 12 anos.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

A certeza da certeza.

[Faxina existencial. Volte mais tarde. Estamos trabalhando para melhor servi-lo.]

Só dizem o que dizem: o bem e o mal.

[“Talvez não exista nada no mundo que seja tão importante para mim como esse sentimento de aventura. Mas ele vem quando quer; desaparece tão rapidamente! Como fico seco quando ele me deixa. Far-me-á essas curtas visitas irônicas para me mostrar que minha vida é um fracasso?”] [Jean-Paul Sartre, A Náusea]

E então de quem você nem espera nada te decepciona. Mas o que leva as pessoas a uma vida tão vazia a ponto de a razão de ser delas tornar-se a conspiração e a maledicência. Gente esquisita / Normalmente incompetente / Normalmente inconsistente / Normalmente inconseqüente / Fica pelos cantos / Fala mal de todo mundo. Gente que faz da tristeza dos outros a própria alegria, pensando que usa os outros impunemente, sem que estes percebam. Pessoas de alma bem pequena / Remoendo pequenos problemas / Querendo sempre aquilo que não têm. Mais que injustiçados pela vida, que não lhes concede a plena felicidade e os sonhos realizados, e pela História, que não lhes absolve como pessoas geniais e incompreendidas pela massa medíocre, eles se acham mais espertos, mais correto, mais diretos. Eis que eles sabem o dia de amanhã / Eles sempre falam num dia de amanhã / Eles têm cuidado com o dia de amanhã / Eles cantam os hinos no dia de amanhã / Eles tomam bonde no dia de amanhã / Eles amam os filhos no dia de amanhã / É que eles têm medo do dia de amanhã. Seguram escorpiões nas mãos e acham que não serão envenenados. É de dar pena, e isso é pior que a morte – ser digno tão-somente de dó, sequer escárnio, apenas compaixão, de tão patéticos que são esses pobres-diabos ricos.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Esse olhar terrível, como se fosse um muro.

[Pequena epifania de alguém: "amar e odiar são o mesmo inferno".]

O melhor caminho para extinguir um amor (ou um ódio) é a Decepção com D maiúsculo, de Derrelição, que leva à surpresa horrível depois ao desprezo, e, por fim, para pôr fim, ao esquecimento. E ser esquecido e pior do que estar morto, Palavra de quem já morreu e já foi esquecido – e já matou e esqueceu.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Interlúdio

"Todo o problema, repito-o, estava em matar o tempo. Por último, acabei por já não me massar, a partir do instante em que aprendi a recordar. Punha-me às vezes a pensar no meu quarto e, em imaginação, partia de um canto e dava a volta ao quarto, enumerando mentalmente tudo o que encontrava pelo caminho. Ao princípio, isto durava pouco. Mas, cada vez que recomeçava, ia durando mais, pois lembrava-me de cada móvel e, para cada móvel, de cada objeto que lá havia e, para cada objeto, de todos os pormenores e, para os próprios pormenores, de uma incrustação, de uma racha, de um bordo quebrado, da cor que tinham, ou da qualidade de que eram feitos. Tentava ao mesmo tempo não perder o fio a este inventário e fazer uma enumeração completa. De tal forma que, ao fim de algumas semanas, passava horas, só a catalogar tudo o que havia no meu quarto. Assim, quanto mais pensava, mais coisas esquecidas ia tirando da memória. Compreendi então que um homem que houvesse vivido um único dia poderia sem custo passar cem anos numa prisão. Teria recordações suficientes para não se maçar. De certo modo, isto era uma vantagem." (Albert Camus, O Estrangeiro)

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Foolish and weak is any human love, but my bride not this.

[De.cep.ção, s.f. (l. deceptione). 1. Frustração de uma esperança; deslusão, desengano. 2. Surpresa desagradável.]

In extremis tu percebes quem te importas contigo e quem preocupa-se somente consigo. De que lado tu ficas, que que lado tu estás? É o instante de revelação, tão claro, certo e evidente que dá vergonha de tanta covardia e má-fé. Separam-se, então, as crianças dos adultos, pois os fracos não têm vez. Os fracos morrerão sós. Quem é confiável e sincero, quem está do seu lado, de mãos dadas na mesma marcha, e quem só fica à tua sombra, esperando para te usar como apoio enquanto for interessante. Enquanto os fracos em desalento ficam pulando de solidão em solidão, o amor se fortalece, metade a metade. É por um triz, à beira do abismo, olhando fundo nos olhos do Nada, que o amor se separa da carência e da conveniência. In extremis.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Faça uma lista de grandes compositores clássicos.

01. Vitezlav Novak
02. Antonin Dvorák
03. Wolfgang Amadeus Mozart
04. Antonio Lucio Vivaldi
05. Louis Hector Berlioz
06. Sergei Vasilievich Rachmaninoff
07. Piotr Ílitch Tchaikóvski
08. Arcangelo Corelli
09. Jacob Ludwig Felix Mendelssohn Bartholdy
10. Georg Friedrich Händel

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Ser corinthiano é ir além.

"Goiás é Brasil", disseram, na brincadeira de costume. E talvez fosse. Mas ontem a Nação Fiel, com 35 milhões de pessoas, se fez soberana. O Brasil ficou pequeno para o Sporte Club Corinthians Paulista. Nada é maior, nada! (E que venha a Série B.)

quarta-feira, 30 de abril de 2008

So many ways to drown a man.

Tela preta, créditos, sirene. Rosto ensangüentado. Chefe de polícia recebe a notícia. Investigação + hospital + formatura dos policiais. To be a police officer means to believe in the law / and to enforce it impartially / respecting the equality of all men / and the dignity and worth / of every individual. / Every day, your life / will be on the line / and also your character. You'll need integrity, / courage, honesty, / compassion, courtesy / and perseverance / and patience. Chefe segura na mão. No primeiro dia de trabalho, ele vê o furuto chefe como "policial do mês". Trabalha com um vagabundo preguiçoso. Prende o estuprador, mas se negá a torturá-lo – ao contrário, conversa com ele. Talk to me. Save yourself. "Little Italy", música italiana, uma pessoa muito considerada na região. Musica italiana ao fundo. Passa o tempo: bigode, costeletas, cabelo grande. Lembro de Falcões Da Noite, aquele totalmente decalcado deste. Sempre reclamam do preciosismo dele. A mãe, só só fala italiano, dá a entender que ele lutyou na Guerra Da Coréia. Sai dirigindo pelas estradas cantando (mal) árias da terra-avó. Compra um sheep-dog na rua por cinco pratas. É uma pessoa tão boa-boba, desajeitada de tão ideal-idealista. [Lembra-me alguém, mas não me lembro quem.] Vai a uma palestra sobre Cervantes, ou uma aula de Espanhol. Encanta uma moça: é divertido. Ela é "bailarira, atriz, budista". Dançam balé na chuva. O colega tira sarro porque ele está lendo a biogafria de uma coreógrafa. Ele tem brilho nos olhos. Fica uma tempão mostrando ele pop-cult descolado com a loira entre os hippies. Ninguém nem acredita que ele é policial. Vira detetive, muda duas vezes de DP. Só um amigo – ambos dando bandeira e com larica na estação de trem, após aula de "degustação" na Academia. Chega a primeira propipna nas mãos, do "judeu Max". Ele pega, fica em casa, aturdido. Cresce o cão, cresce a barba. Todos o aconselham a aceitar o dinheiro, a fi mde não trazer problemas. Vai perdendo a graça e a iridescência do olhar. Conhece a namorada, vizinha, ouvindo Di Stéfano no quintal. Quer mudar de distrito. Ninguém o quer porque anda à paisana. Alguém já me disse que você tem tendências para a auto-piedade? Policiais mais velhos escondem tudo fingindo ajudar; os mais novos se indignam. Quem confia num policial que não aceita dinheiro? Mãos trêmulas, tensão, crises de culpa. Did you ever hear the story of the wise king? Well, there was this king, and he ruled over his kingdom. Right in the middle of the kingdom there was a well. That's where everybody drank. One night, this witch came along... and she poisoned the well. And the next day, everybody drank from it except the king... and they all went crazy. They got together in the street and they said... "We got to get rid of the king, 'cause the king is mad." And then that night, he went down and he drank from the well. And the next day all the people rejoiced... because their king had regained his reason. [Ele tem um piercing igual ao meu. Ele tem uma figura belíssima. Em comum, acho que só a bebedeira, os olhos caídos envoltos por olheiras e o agir bobo.] Um amigo, um cão, uma mulher. Ele insiste, é meio Carlos Lopes. Frank, você está se comportando como criança. Começa a descontar os problemas nas únicas pessoas que tem. Se eu pudesse trabalhar sozinho... ele surta, sua, seus olhos apagam. Prende um agiota; quando volta, o cara não só está solto, mas conversando com os outros detetives. Num simbolismo – figura de Jesus, roupa branca manchada de sangue – tem praticamente um amok, espanca o bandido, quebra tudo, xinga todos. Não interessa quem sofrerá, mesmo eu. A mulher vai embora. Encontro no café. Continue se torturando! / Fique comigo! / Não, não! Corrida na rua, desespero, a música vem num crescendo – o único momento com trilha sonora que não é na colônia italiana – It's finished! Tomadas inusitadas o tempo todo, misturando cortes bruscos com longos planos-seqüência. O processo é uma farsa, os superiores não dão a mínima. Muda de distrito, briga logo na chegada, é hostilizado, mas o chefe ajuda: ele consegue mais um amigo! Vão à imprensa. Transferido de novo, para ficar só. Scared, miserable, dreading to go to work. Vai para Narcóticos, muito mais dinheiro, propinas de 40 mil dólares. Armam para cima dele. Omitem-se quando ele precisa de cobertura. A mão presa na porta, cortada, o sangue o desespero. Não devemos falar com ele, pois ele não presta. No hospital, despreza o distintivo-de-ouro. What's this for? For being an honest cop? Or for being stupid enough to get shot in the face? Estado deplorável. Quase-choro. Angústia. Tem alta: paralisia do lado esquerdo, surdez de um dos ouvidos, vertigem. Imprensa novamente. Pequena-Itália novamente. Ele e o cão. Sentando à calçada. Sísifo triste. Créditos.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Estou por aí sempre pensando nela.

Depois da mulher da minha vida é a mulher da minha vida. E dela nem a mulher da minha vida tem ciúme, pois é a mulher da vida dela também. E meu texto que ia ser postado aqui sobre o show da Fernanda Takai ontem na Virada Cultural estava tão cheio de metáforas de fã apaixonado e com tantas referências ao trabalho-solo e ao Pato Fu que resolvi fazer logo uma poesia.

sábado, 26 de abril de 2008

Um Zero

Não sei como é para quem não escreve, ou escreve só por lazer. Mas para mim, que faço disso profissão-de-fé, há livros que são simplesmente bons, ótimos, marcantes, e aqueles que influenciam no estilo de escrever para o resto da vida, ainda que com oscilações de intensidade conforme as épocas, até que ela se cristalize e seja agregada ao estilo próprio.

Assim foi com os poemas de Augusto dos Anjos ("Ah, então a poesia pode ser podre, grotesca e horrenda, e, ainda assim, magnífica?"), Álvaro de Campos ("Ah, então além de não precisar de nenhuma rigidez formal, dá pra dizer o indizível, dá pra descrever o indescritível?"), Cecília Meireles ("Ah, então eu posso dizer o indizível com a tristeza delicada da impermanência da vida ante a eternidade da natureza, e ainda com músicalidade mesmo sem rima?") e Arthur Rimbaud ("Ah, então além de escrever sobre coisas horrendas, posso fazer poesia sem versos?", além dos romances de Graciliano Ramos & Albert Camus ("Ah, então eu posso escrever romances curtos, sem muito desenvolvimento de personagens além da sondagem psicológica, e fazer algo ao mesmo tempo sólido, denso, tenso e rápido?"), Jean-Paul Sartre ("Ah, então dá pra transformar o indizível num romance em prosa normal?"), Clarice Lispector ("Ah, então pode fazer romance sem história e só com rascunhos de personagens?") e Mário Benedetti ("Então eu posso usar recursos batidos, como escrever como num diário, usar um final impactante, e tudo isso sem parecer clichê?").

E aos 28 anos, depois de tanto livro lido, vem, no fundo, um pensamento bobo de que, mesmo com tanta coisa ainda por ler, tanto clássico e tanta jóia rara, eu dificilmente seria impactado por alguma coisa, ainda que eu leia para ter vontade de escrever, para ter vontade de tocar, para ter vontade de fotogafrar, para ter vontade de desenhar para ter vontade de... escrever. Jamais deixo de manter toda essa interação entre tudo que sou e faço.

Por sorte esse pensamento pálido foi demolido recentemente pel'As Palavras, do Sartre ("Ah, então eu posso fazer uma autobiografia sem nenhuma fato relevante e ainda assim ficar lindo pela própria linguagem?") e, é claro, pelo Zero, do Ignácio de Loyola Brandão. ("Ah, então eu posso misturar tudo isso que eu disse durante este texto?")

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Zero Zero

UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO

Carlos Lopes subiu escadas, tomou elevadores, andou pelos saguões cheios de bancos cheios de gente dos institutos, bateu em guichês, perguntou, pediu, correu. Em dois anos, se esqueceu de tudo, não voltou mais para casa, se esqueceu do trabalho, da vida, querendo salvar o filho nos braços. A roupa do corpo foi se esgarçando, a camisa se acabou, o terno estava fino, foi se rompendo. Mas Carlos Lopes era antes de tudo, um forte. Tinha esperança e sabia que iria reencontrar o guichê certo.

. No 177.
. No 178.
. No 175.
. No 179.
. No 174.
. No 1774.

Se enganava com os números, voltava ao 174.

. No 177.
. O senhor esteve aqui faz cinco minutos. Vá ao 1111.

[LIVRE ASSOCIAÇÃO: eu dei o disco
do jorge e a
gente se gostava mas você queria um
rico e a sua vida
bem aranjada você dizia vochê
? porque sumiu]

. Este é o 11111.

No 1111 mandavam ao 2222.

Carlos Lopes prossegue. É um inabalável. Acredita na natureza humana, tem esperanças de um 'novo provir'. Sobe as escadas embalado por visões de triunfo. Quer o seu guichê, quer salvar o filho. E grita e o seu é um grito soberbo de fé. O guichê, o guichê há de se abrir sobre ele, abra suas portinholas sobre nos! Das lutas na tempestade dá que eu ouça tua voz.

Numa madrugada, ao rubro lampejo da aurora, um homem nu subiu as escadas do instituto.

Não mão, levava um esqueletinho branco.

. Guiche 9.
? Está morto. Então é o guichê 7.
. Que mania de mandarem mortos para mim. Guichê 14.

Que neste instituto eu ache irmãos, nbão tiranos hostis.

. 12.
. 1.
. 22.
. É aqui. Deixe-o ver.

Mas nas guerras bos transes supremos eis de ver-nos lutarc e vencer.

? Ver o menino.
. Não sua documentação.

A maleta cheia foi passada, o funcionário examinou.

. Tem um problema.
? Qual.
. O senhor não tem mais direito a nada.
? Por quê.
. O senhor abandonou o emprego, faz dois anos.
. Tinha que cuidar do menino.
? Mas o menino não está morto.
. Mas estava vivo.
. O senhor matou.
. Não, é que demorou.
. O senhor matou. Matou seu filho.

Chamou os guardas e prendeu Carlos Lopes. Será julgado no dia 7 de dezembro e há poucas probabilidades de não pegar prisão perpétua.


[Ignácio de Loyola Brandão, Zero.]