Sabe aquele ateu chatão que, quando ouve um bem-intencionado “vai com Deus/fica com Deus”, responde mal educadamente que Deus não existe, etc.?
Pois tem horas em que a esquerda age exatamente assim, eu incluso, portanto vou fazer um mea-culpa aqui.
Exceto por Luciano Huck e Neymar, oportunistas que não conseguem fazer absolutamente nada que não seja pensando em marketing e dinheiro (como se já não tivessem o bastante), estou certo de que a ampla maioria das manifestações de apoio ao gesto (genial) de Daniel Alves contra o racismo sofrido no final da semana passada foi movida pelas melhores intenções.
No entanto, a esquerda em geral (e não só o movimento negro) caiu de pau nas fotos com banana e na tag #somostodosmacacos, alegando que era banalização do problema, que era um defeito do brasileiro tratar tudo como brincadeira, que branquelos só querem saber de aliviar suas consciências de classe média e mais um monte de reclamações nessa linha. Além de posts-bronca no Facebook, surgiu até a tag #nãosomosmacacos no Twitter.
E mais uma vez ficou aquela sensação de que os movimentos sociais passam o tempo todo batendo bumbo para terem suas causas ouvidas, mas, quando alguém de fora tenta mostrar algum tipo de apoio, é imediatamente rechaçado.
É o mesmo tipo de reação do movimento feminista, que geralmente tanto recusa o apoio masculino (“homem não pode ser feminista”) quanto encrenca com coisas como receber parabéns pelo Dia das Mulheres, por ser uma data de luta (e não de comemoração).
Não tiro a razão de nenhuma dessas alegações, nem dos negros, nem das mulheres (apesar de muitos homens brancos também passarem esses tipos de sermão por aí), mas será que não estamos todos sendo ranzinzas demais?
Uma hashtag não resolve nada? Talvez não, na verdade não mesmo. Mas é simbólico, é um gesto de quem pretende mostrar que se importa, que apoia aquela causa de algum jeito (mesmo que de um jeito inócuo), sem saber de que aquilo é oportunismo de marqueteiro.
Da mesma forma que o homem que parabeniza a mulher “pelo seu dia” só está querendo ser gentil, educado, quem postou foto com banana nas redes sociais está tentando demonstrar empatia.
Historicamente a esquerda perde tempo demais brigando entre si, enquanto a direita releva suas diferenças em nome do poder.
E nos últimos dias passamos mais tempo discutindo a “forma correta” de se manifestar contra o racismo do que nos manifestando contra ele de fato.
Tem muito sommelier de manifestação, hostess de movimento social, que aparentemente acha que só preto pode falar sobre pretos – e preto não pode falar sobre travestis, a não ser que também seja um; e o branco hétero sem-terra, por exemplo, tem que ficar quieto e esperar a sua vez de se manifestar.
Antes de saber que era uma ação de marketing, já estávamos reclamando de o Neymar se manifestar contra o racismo “por ele não se achar preto”. Quer dizer, se o cara é alienado, reclamam; se ele mostra alguma consciência social, também não pode.
O playboy não pode ouvir Racionais MCs – porque sendo playboy ele necessariamente não se importa com a periferia, sequer tem algum interesse de sabê-la.
Se alguém notoriamente cretino, como o Reinaldo Azevedo apoia, então a campanha está obviamente errada; ninguém pensa “olha só, se até ele apoia é sinal de que isso já não é mais tolerado como antes”.
Prefiro achar que essas manifestações, inócuas ou não, mostram que o Bem continua sendo a maioria, como sempre foi (muito embora os fatos tentem nos convencer do contrário). Que rotular imediatamente de hipócrita qualquer pessoa "de fora" que tenta ajudar não colabora muito para causa alguma.
E que qualquer apoio que não seja o do Luciano Huck é sempre bem-vindo.
Pois tem horas em que a esquerda age exatamente assim, eu incluso, portanto vou fazer um mea-culpa aqui.
Exceto por Luciano Huck e Neymar, oportunistas que não conseguem fazer absolutamente nada que não seja pensando em marketing e dinheiro (como se já não tivessem o bastante), estou certo de que a ampla maioria das manifestações de apoio ao gesto (genial) de Daniel Alves contra o racismo sofrido no final da semana passada foi movida pelas melhores intenções.
No entanto, a esquerda em geral (e não só o movimento negro) caiu de pau nas fotos com banana e na tag #somostodosmacacos, alegando que era banalização do problema, que era um defeito do brasileiro tratar tudo como brincadeira, que branquelos só querem saber de aliviar suas consciências de classe média e mais um monte de reclamações nessa linha. Além de posts-bronca no Facebook, surgiu até a tag #nãosomosmacacos no Twitter.
E mais uma vez ficou aquela sensação de que os movimentos sociais passam o tempo todo batendo bumbo para terem suas causas ouvidas, mas, quando alguém de fora tenta mostrar algum tipo de apoio, é imediatamente rechaçado.
É o mesmo tipo de reação do movimento feminista, que geralmente tanto recusa o apoio masculino (“homem não pode ser feminista”) quanto encrenca com coisas como receber parabéns pelo Dia das Mulheres, por ser uma data de luta (e não de comemoração).
Não tiro a razão de nenhuma dessas alegações, nem dos negros, nem das mulheres (apesar de muitos homens brancos também passarem esses tipos de sermão por aí), mas será que não estamos todos sendo ranzinzas demais?
Uma hashtag não resolve nada? Talvez não, na verdade não mesmo. Mas é simbólico, é um gesto de quem pretende mostrar que se importa, que apoia aquela causa de algum jeito (mesmo que de um jeito inócuo), sem saber de que aquilo é oportunismo de marqueteiro.
Da mesma forma que o homem que parabeniza a mulher “pelo seu dia” só está querendo ser gentil, educado, quem postou foto com banana nas redes sociais está tentando demonstrar empatia.
Historicamente a esquerda perde tempo demais brigando entre si, enquanto a direita releva suas diferenças em nome do poder.
E nos últimos dias passamos mais tempo discutindo a “forma correta” de se manifestar contra o racismo do que nos manifestando contra ele de fato.
Tem muito sommelier de manifestação, hostess de movimento social, que aparentemente acha que só preto pode falar sobre pretos – e preto não pode falar sobre travestis, a não ser que também seja um; e o branco hétero sem-terra, por exemplo, tem que ficar quieto e esperar a sua vez de se manifestar.
Antes de saber que era uma ação de marketing, já estávamos reclamando de o Neymar se manifestar contra o racismo “por ele não se achar preto”. Quer dizer, se o cara é alienado, reclamam; se ele mostra alguma consciência social, também não pode.
O playboy não pode ouvir Racionais MCs – porque sendo playboy ele necessariamente não se importa com a periferia, sequer tem algum interesse de sabê-la.
Se alguém notoriamente cretino, como o Reinaldo Azevedo apoia, então a campanha está obviamente errada; ninguém pensa “olha só, se até ele apoia é sinal de que isso já não é mais tolerado como antes”.
Prefiro achar que essas manifestações, inócuas ou não, mostram que o Bem continua sendo a maioria, como sempre foi (muito embora os fatos tentem nos convencer do contrário). Que rotular imediatamente de hipócrita qualquer pessoa "de fora" que tenta ajudar não colabora muito para causa alguma.
E que qualquer apoio que não seja o do Luciano Huck é sempre bem-vindo.
2 comentários:
eu acho lindo que ocorra apoio, mas o problema da solidariedade cega ao movimento é que boa intenção, mas falta de conhecimento de causa, podem acabar perpetuando exatamente o que se quer e precisa exterminar.
não vejo como ressignificar o xingamento macaco, não vejo como ~nivelar por baixo~ pode ajudar, afinal, quem é chamado de macaco, não quer que todos sejam chamados de macaco [até porque brancos, loiros, ruivos nunca seriam] quer é que macaco deixe de ser um xingamento porque simplesmente pararão de usa-lo como ofensa. macaco enquanto xingamento desumaniza, coisifica e abre a deixa para que a exploração, a humilhação entrem pela porta.
acho importante discutir, sim, a solidariedade ao movimento, escutar quem está na luta nõa por solidariedade, mas porque pertence a ela por essência, para que cheguemos a um apoio que seja positivo, que não seja um tiro pela culatra.
Concordo...
E ainda acrescentaria nisso duas questões. A primeira é quando você diz:
"Antes de saber que era uma ação de marketing, já estávamos reclamando de o Neymar se manifestar contra o racismo “por ele não se achar preto”. Quer dizer, se o cara é alienado, reclamam; se ele mostra alguma consciência social, também não pode".
E realmente é bem isso. E digo mais. Muitos ficaram "chateados", porque o Neymar "não é politizado o bastante para esse tipo de ação" (~combater o racismo~). Como se o Neymar (e levo isso para a maioria dos jogadores), fosse obrigados a "não serem alienados".
Um exemplo>
"Neymar disse, em começo de carreira, que nao se enxerga como negro. Talvez por isso a discriminação que sofre em alguns campos da Europa o faça preferir tratar o assunto com desdém ao agressor, em vez de assumir seu papel social como craque, adotar uma postura combativa – de fato – ao racismo e reivindicar puniçao às autoridades do futebol".
>> http://www.bluebus.com.br/nos-nao-somos-macacos-breiller-pires-seu-blog-na-revista-placar/
Desde quando o ele precisa adotar uma "postura combativa", ou ser politizado (ou não alienado)?. Não acho que essa seja a obrigação do jogador, até porque, como sabemos, a grande maioria não tem nenhum grande preparo educacional, estrutural, etc... cobrar de um jovem de 21 anos, recém milionário, que, provavelmente, teve uma educação "falha" (não chega bem a ser o caso do Neymar, mas, dá para enquandrar), que ele seja "combativo" e "não alienado", chega a ser desonesto.
Não significa que não seja ótimo quanto temos um Socrates, Afonsinho, Paulo André, etc... porém, são exceções. Cobrar da maioria essa postura é, repito, algo desonesto. Até porque, em profissões em que a "consciência política" deveria ser obrigação, como no jornalismo, não temos lá muitos bons exemplos.
Outro ponto que muito me chamou atenção foi a profusão de textos sobre o "Não somos macacos" (do qual concordo com muitos), mas, que me pareceram um tremendo oportunismo. Tipo, quando o Neymar fez essa "campanha", fiquei até surpreso com a surpresa de muitos, pois, faz uns "200 anos" que a torcida do Inter grita nos estádios "ahhh eu sou macaco"... Óbvio que a repercussão do Neymar fazendo isso é bem maior que da torcida do Inter. Entendo isso. Porém, vi muitos "especialistas" criticando o fato de as pessoas só descobrirem agora o "racismo", e só se importarem porque é algo "Midiático". Ok, pode ser. Mas, sua atitude não é a mesma? porque não vi antes os mesmos "especialistas" criticarem ou analisarem o fato de a torcida do Inter (muito pela questão de um racismo terrível da torcida do Gremio), gritarem "ahh eu sou macaco", meio que seria a obrigação deles saber disso, pois, mal ou bem, estamos falando de um Estado importante do país e tals... Enfim...
Me passa mais ou menos a impressão daquela pessoa que ficou revoltada com as declarações do novo presidente do SPFC sobre "desdentados" (infeliz, por sinal)... Mas, que nunca percebeu (ou ignora) que o apelido de "gambá" para os corinthianos é pejorativo que o Flamengo é chamado de Flavela também de forma pejorativa, etc...etc... meio que se torna um "oportunismo crítico", diria...
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