"Os estereótipos são numerosos. Os grupos étnicos são estereotipados, os cidadãos de outras nações e religiões são estereotipados, os gêneros e as preferências sexuais são estereotipados, as pessoas nascidas em várias épocas do ano são estereotipadas (astrologia solar) e as ocupações são estereotipadas. A interpretação mais generosa atribui esse modo de pensar a uma espécie de preguiça intelectual: em vez de julgar as pessoas pelos seus méritos e deficiências individuais, nós nos concentramos em uma ou duas informações a seu respeito, que depois inserimos num pequeno número de escaninhos previamente construídos. Isso poupa o trabalho de pensar, embora em muitos casos custe o preço de cometer uma profunda injustiça." (Carl Sagan, O Mundo Assombrado Pelos Demônios)
Já se pegou tendo que explicar os maiores absurdos, tipo pegando na mão de gente que teve e tem acesso fácil à cultura, e mostrando, com paciência mais que paterna, quase eclesial, que “olha, não é bem assim, isso é achismo seu, não tem fundamento algum, não se deixe levar pelo senso-comum, questione as coisas que estão arraigadas na sociedade como se fossem verdades irrefutáveis”.
Falta senso crítico, falta autocrítica, falta questionamento honesto e independente. Não bastam aqueles métodos “como ler um livro”, e sim como pensar no que foi lido e em todas as outras coisas que há. Parece tanta preguiça de sair dos confortáveis lugares-comuns habitados por clichês e preconceitos.
E o mundo dessas pessoas de classe média, tão preparadas desde a infância para formar a elite que conduziria o país sob a égide da Nova República, acaba se melindrando ao ver que o Diabo é mais feio in loco do que na pintura.
Ouve-se de tudo: Caetano Veloso é metido, pobreza não tem a ver com violência, a Marta é perua, qualquer remédio com álcool faz mal, brasileiro é preguiçoso, gays e negros cometem mais preconceito do que sofrem, cotistas vão mal na universidade, positivismo e psicanálise têm resposta para tudo, astrologia funciona, ateus têm crença, etc.
Por isso, por essa preguiça de pensar, de enfrentar os preconceitos da própria cabeça, que as pessoas insistem, ainda hoje, em justificar comportamentos escrotos com base em factóides, em memes tão absurdos (como as teorias de Lombroso, The Bell Curve ou os Protocolos de Sião, além de textos bíblicos descontextualizados) que só se propagaram pela vontade das pessoas em se apegar a qualquer coisa para não enfrentar a verdade, para não ter que amadurecer, não ter que lutar conta o desconforto de se descobrir anacrônico, ridículo, limitado.
Assim as pessoas se apegam aos clichês que dão a falsa impressão de conforto, de segurança. Afinal, o mundo lá fora, com tantas verdades que insistem em contrariar nossas crenças, é deveras perigosos, não é mesmo? Queima as mãos... e a gente passa adiante, de geração pra geração.
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