quinta-feira, 21 de agosto de 2008

A palavra perdeu o poder de curar, é somente um vírus que distorce o real.

“De repente a pergunta é: ‘o que você está dizendo com ela?’, e não ‘você consegue tocar assim?’, ou ‘qual é a sua velocidade?’. A pergunta é ‘o que você está fazendo com seu instrumento?’, ‘o que está sendo comunicado nesta canção?’. De repente, as guitarras não eram uma coisa para agitar na frente da platéia, mas sim algo que você usava para chegar à multidão... eu tive que reexaminar totalmente meu jeito de tocar, aprender a reconhecer que as notas realmente significam alguma coisa. Penso nas notas como uma coisa cara. Você não pode simplesmente jogá-las para todos os lados.” (David “The Edge” Evans)

Que isso sirva se lição não só pra mim – fazer trampos (de guitarra, de literatura, de vida) redondos, perfeitos, coesos e concisos, burilados à exaustão, até que não haja mais no que mexer, sequer uma nota fora do lugar – mas para todos os artistas patéticos que tenho criticado nos últimos posts.

Faça uma lista de grandes músicas do U2

01. Acrobat
02. Beautiful Day
03. Drowning Man
04. Exit
05. Luminous Times
06. Miracle Drug
07. New Year's Day
08. The Unforgettable Fire
09. Tomorrow
10. Until The End Of The World

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Dança do quadrado

“O rock é uma coisa mais quadrada, assim, de verso-refrão-verso.”


Essa foi a justificativa de Lucas, o vocalista do Fresno, sobre o porquê de a experiência de tocar com Chitãozinho & Xororó ritmos como country, marcha-rancho e moda-de-viola era enriquecedora, durante o Estúdio Coca-Cola.

Bom, evidentemente que C & X são grandes músicos, têm uma carreira respeitabilíssima e eu me sentiria muito honrado em participar de algo com eles. O problema é o rapaz me sair com uma pérola dessas, praticamente dizendo que o rock é um estilo limitado.

[Nem vou comentar o quanto foi irrelevante a contribuição dos fresnos para as canções de C & X com suas guitarras fracas e melodias óbvias tocadas por músicos medíocres.]

Após a perplexidade, a fúria, a tristeza e o ataque de gastrite nervosa, comecei a pensar em discos convencionais e quadrados de rock como Highway 61 Revisited, Revolver, Quadrophrenia (opa), Are You Experienced?, Gita, Acabou Chorare, Selvagem?, Transformer, etc. e acabei concluindo, resignado, que o rock DELE, o som que ELE faz é quadrado porque ele faz parte de uma banda e de uma geração bunda-mole que não aprende nada com o passado e só quer saber de faturar com o que está na onda momentânea. Um cara que diz isso nunca ouviu os discos supracitados na vida. Banda clássica pra ele deve ser o Fall Out Boy. E ele deve andar preocupado demais pintando as unhas e fazendo franjinha pra se preocupar com referências musicais audaciosas e instigantes.

[Post escrito ao som de Seu Francisco. Agora com licença, vou colocar o Transa pra rolar aqui. Discos que descem redondo como cervejas. E que caia um paralelepípedo, bem quadrado, cúbico, pesado e duro, na cabeça dos fresnos.]

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Don't believe the hype

O que bombava em 68?
O que bombava em 78?
O que bombava em 88?
O que bombava em 98?
O que bomba em 2008?

Pense.

A música melhorou ou piorou?

Claro que não piorou (até porque isso é muito subjetivo); é muita ingenuidade artística achar que a qualidade da música pode ser medida pela mídia, que existem "movimentos", que há épocas melhores ou piores para a música.

Em todas as épocas há gente inovando, buscando caminhos instigantes, e gente a favor da maré, tentando se enquadrar no que a mídia deseja. E como a indústria cultural só estende seus tentáculos massificadores ano após ano, cada vez mais tem negociatas de empresários que colocam os cifrões acima da qualidade e gente que se prostitui por grana e fama. Como correr atrás da onda é o mesmo que tentar morder o próprio rabo, cada coisa minimamente nova que surge vem acompanhada de uma porção de aproveitadores loucos para surfar na marola que a última onda causou.

Só para citar exemplos: os Raimundos, extremamente originais, e descobertos de formas genuína pelos Titãs e pelo Miranda, geraram uma enorme febre de forró-core, de modo que tivemos que aturar horripilâncias como Catapulta e outra do qual nem lembro o nome, mas que tinha uma versão forrocorizada de Tudo Azul, do Lulu Santos; quando o já fabricado Charlie Brown Jr. apareceu, o Dr. Bonadio Frankenstein não se contentou em faturar uma vez só e clonou sua cria não só uma, mas duas vezes (Tihuana e O Surto).

Bobagem achar que não há mais boas bandas em Seattle desde 1992, por exemplo; só deixaram de procurá-las por lá, assim como deve haver um monte de caipiras cheios de laquê fazendo hard-farofa em New Jersey e branquelos raquíticos misantrópicos querendo destruir o cristianismo na Noruega. Tudo depende do interesse midiático. Ou nenhuma música boa foi feita no Brasil durante as ondas de lambada, sertanejo, pagode, axé e pancadão? E agora, após o tosco revival 80s e em pleno império emo (pagode com guitarras), não há gente fazendo boas sonzeiras por aí?

E isso serve de preâmbulo pro que vemos hoje.

Tive o desprazer de acompanhar o último Top 10 da MTV (devem ser os únicos dez clipes que eles ainda passam, já que virou um canal sub-Home & Health.), e o que vi?

À exceção do Weezer, do qual não gosto, mas sei que é uma banda de verdade, e apresentou um clipe mais ou menos criativo (mesmo que a idéia de fã-clipes tenha sido usada aqui pelo finado Gram uns três anos antes), o resto parecia a mesma música com mixagens visuais e sonoras um pouco diferentes. De Fall Out Boy e My Chemical Romance, passando por Pussycat Dolls, Alanis Morrisette e Avril Lavigne, eram superproduções cheias de efeitos, linguagem visual acelerada, roteiro brega e cheio de clichê e músicas parecidíssimas – tudo over, nem muito leve, nem muito pesado, pastel-de-vento total, com letras inócuas e rebeldia blasê calculada.

Fiquei triste por quem se perde naquilo, deixando de conhecer tanta coisa boa do passado e do presente, e feliz por estar alheio a isso, ouvindo e fazendo a música que me agrada. Mas é assim mesmo: os Beatles não foram recusados por uma gravadora em 1962 porque "aquele negócio de grupos de rock já estava fora de moda"? Então...

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Pequeno perfil de um cidadão comum

Corpo de inglês é achado na cama 2 anos após morte

Da BBC Brasil

O corpo de um aposentado inglês ficou dois anos deitado sobre sua cama até ser descoberto pela polícia em sua residência, na cidade de Huncoat, no noroeste da Inglaterra, depois que os vizinhos reportaram sua ausência.Brian Dean, de 70 anos, foi encontrado depois que os policiais arrombaram a porta de sua casa e se depararam com o corpo sobre a cama.

Pelas correspondências encontradas na porta da casa de Dean, os policiais concluíram que o aposentado estaria morto há dois anos."Acreditamos que o corpo de Dean estaria na casa há dois anos porque a correspondência data de 2006 e estava empilhada atrás de sua porta", afirmou o inspetor Jill Johnston, da polícia local."Sabemos que ele era um homem muito reservado e é muito triste que ninguém tenha sentido sua falta durante tanto tempo", disse.

Os policiais informaram ainda que o corpo estaria sendo analisado para determinar a causa da morte e a polícia estaria tentando encontrar familiares para informar sobre a morte do aposentado.

Segundo os policiais, as autoridades locais não sentiram a falta do aposentado pois todas suas contas eram pagas via débito direto em conta e ele recebia dinheiro mensalmente por conta de sua aposentadoria.

Segundo os vizinhos, Dean era um homem muito reservado e raramente visto em público."Todos sabiam que Brian era recluso. Ele costumava sair tarde da noite e voltar apenas de manhã, quando ainda estava escuro", disse o vereador Paul Gott, da prefeitura local.

Ele afirmou que a morte de Dean poderia servir como um alerta para que as pessoas prestem mais atenção em seus vizinhos."Acho que todos deveriam olhar para sua comunidade e quem faz parte dela e se perguntar se há alguma possibilidade de alguém estar desaparecido", disse Gott."Pode ser intrusivo bater na porta das pessoas e perguntar se está tudo bem, mas é sempre uma boa lembrança", concluiu.

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Temos a internet para nos conectarmos com o mundo inteiro, acessar infindáveis conhecimentos e conversar com um monte de gente em fóruns, por meio de instant messengers ou sites de relacionamento. Possuímos livros digitais, jornais e revistas segmentadas ab absurdum, além das propagandas de toda sorte que nos bombardeiam com promessas mal cumpridas. Temos centenas de canais de TV a cabo, moramos em condomínios com centenas de pessoas, os passeios públicos e as avenidas estão sempre lotadas, assim como os transportes de massa e até as opções de lazer. Conversamos com tanta gente todos os dias... e, no entanto, não conhecemos ninguém, mal a nós mesmos.