"I don't want that holy water
It makes me burn
I don't want that holy water
I guess I'll never learn
I'd rather drink from the Devil's Well
And then I'll go to Hell."
(Mercyful Fate, Holy Water)
Pequeno
tratado sobre como a imprensa paulista se comporta como assessoria de imprensa
do PSDB, e mais do que nunca desde o ano passado.
– Polícia descobre ordem do PCC para matarem
o Alckmin
Tem
crise, tem eleição? Não importa se estamos em 2006, 2001 ou 2013: bóra
requentar o plano do PCC para matar o Alckmin porque supostamente eles estariam
endurecendo contra o crime.
Sim,
o governo do PSDB, que está no poder desde 1995, sob o qual o PCC, fundado em
1993, basicamente surgiu, cresceu e engordou; o governo que inclusive fez
acordo com o Marcola em 2006.
É
absurdo porque o PCC não tem do que reclamar do Geraldo, é absurdo porque a
história é requentada há 7 anos, é absurdo porque, se quisessem, o governador
já estava na cova com o Covas havia tempos.
As
investigações, se houve, nunca mais foram divulgadas, e Alckmin teve
oportunidade de bradar que não se acovardaria diante dos meliantes, etc. e tal.
Alguém
da imprensa contestou sobre a duração dessa fatwa?
Houve investigação da mídia quanto ao teor esses relatórios da polícia? Não.
– Polícia descobre plano mirabolante para
Marcola fugir da prisão
Em
fevereiro deste ano, a polícia paulista apareceu com essa: desde 2013 o PCC
estaria agitando uma fuga para o Sr. Camacho, com direito a dois helicópteros
blindados camuflados e um avião.
Bom,
em sendo verdade isso, não é preciso ser nenhum grande estrategista pra
imaginar que o ideal seria esperar o plano ser executado, para pegar todos com
a boca na botija, e encarcerá-los (ou passar chumbo geral, como é da predileção
da PM paulista).
Não, o
tal plano foi divulgado antes pela imprensa, Marcola foi transferido para um
regime disciplinar mais rígido, e ninguém envolvido no tal plano foi preso, ouvido,
nada.
Alguém
da imprensa questionou a verossimilhança desse plano ou a revelação precoce da
polícia? Não. A mídia, novamente passiva, comprou a versão oficial e se limitou
a reproduzi-la. Especialistas em segurança, lá no rodapé de alguns textos, questionavam
a plausibilidade desse plano espetacular, mas ficou nisso mesmo.
E
Geraldinho posou de durão contra o crime, mais uma vez.
– Se existe superfaturamento nos trens e no
metrô, o estado de São Paulo é vítima
Há
um esquema de propina atuando pelo menos desde 1998 no sistema
metroferroviário, lesando o erário em quase R$ 1 bilhão em inúmeras licitações
fraudulentas, envolvendo negociatas entre empresas como Alstom e Siemens,
funcionários da CPTM e do metrô, e, segundo documentos e depoimentos, gente
graúda dos governos Covas, Serra e Alckmin.
A
primeira providência do governador, abraçada imediatamente pela mídia, é chamar
o caso simplesmente de cartel – porque aí o estado seria apenas vítima,
coitadinho.
Propinoduto,
tremsalão...? Nada disso, apelido é só contra os petralhas. Afinal, até o
mensalão deles é ‘mineiro’ em vez de tucano.
E
que se houvesse comprovação de alguma coisa, que os culpados fossem punidos,
naquele blasé de que só subalternos das empresas de transporte sobre trilhos
estariam envolvidos, café-pequeno.
Olha,
se um esquema bilionário de propina atua há mais de 15 anos, no maior
descaramento – três ou quatro empresas se revezam entre uma ganhar e
subcontratar as outras –, sempre com preços acima do mercado, ou o Governo Estadual é muito ladrão, ou é muito incompetente, nem sei o que é mais grave.
Especialistas
dizem que normalmente os carteis faturam por volta de 5% nesse tipo de esquema;
porém, em São Paulo, houve sobrepreço de até 25% em algumas pseudolicitações.
Eu
mesmo li na grande imprensa (Folha, Estado) sobre falcatruas da Alstom em 2005,
depois novamente em 2008. Mas o Governo do Estado não sabia de nada, nadinha.
Isso
tudo foi questionado pela imprensa? Adivinha.
Exceto
pela IstoÉ, e uma matéria ou outra da Globo, o caso vem se arrastando na
imprensa, com matérias sem destaque algum nos jornais (manchete, nem pensar),
sem nunca chamar o bicho pelo nome: inventou-se a corrupção sem corruptos, só
se fala das empresas, nunca dos políticos.
Mensalão
(ou caixa 2, whatever)? Claro que o
Lula sabia! Dirceu foi condenado por Barbosa porque “não tinha como não saber”
do esquema, mesmo sem provas. Já Covas, Serra e Alckmin jamais foram ligados
diretamente a nada, sequer se questionou o atual governador sobre isso.
Até
o ridículo de Alckmin fazer uma lista de cartel com uma empresa só – a infame
Siemens, que resolvera denunciar o esquema todo – foi noticiado muito
discretamente. Idem para o envolvimento de gente graúda como Andrea Matarazzo,
Robson Marinho ou Aloysio Nunes: é sempre lá no meio do jornal ou do site, sem
alarde.
Também
há o fato de que jamais esse rombo bilionário é ligado, direta ou
indiretamente, ao estado patético, deplorável, em que o transporte sobre
trilhos se encontra: a malha avança a pífios 2 km por ano (culpa do Governo Federal que não ajuda, segundo Geraldinho), linhas como a Amarela estão
atrasadas há mais de 10 anos, os trens pifam o tempo todo, com falhas às vezes
muito perigosas, mas a culpa é do usuário, que não tem horário de trabalho
flexível, e ainda dá uma de vândalo e aciona um tal botão secreto (!) – até
isso foi comprado pela imprensa.
Mais
uma vez, a mídia se comporta como uma Voz do Brasil estadual: apenas reproduz
os discursos do Executivo.
– A falta d’água é culpa da seca, nada mais,
e mesmo assim estamos preparados
Esta
é a mãe de todas as cascatas (secas): não tendo como colocar a culpa no PT, nem
no usuário, nem em outras empresas, simples!, Alckmin fala que a culpa é
simplesmente de São Pedro. Desculpa, não choveu, não podemos fazer nada.
Bom,
na verdade podiam. Tá certo que fez muito calor e quase não choveu, porém é
obrigação do governo estar preparado para esse tipo de coisa, dispor de
reservatórios, ainda mais porque desde 2001 (e depois foi dito em 2003, 2004 e
2009 de novo) que os estudos apontavam que o Sistema Cantareira ia se esgotar
logo.
O
que foi feito? Nada. A Sabesp estava provavelmente mais preocupada em
distribuir os lucros anuais de R$ 500 milhões aos acionistas, ou em gastar R$
3,6 bilhões (em 22 anos) na despoluição dos rios Tietê e Pinheiros, que, como se
pode ver e cheirar, seguem mortinhos da silva (só a IstoÉ Dinheiro deu destaque
a isso, aliás). Sem falar no recém-denunciado (pela Carta Capital) esquema de
superfaturamento, coisa de mais de R$ 1 bilhão, em licitações da empresa.
Mesmo
assim, era só ir à televisão uns três meses antes da desgraça completa e dizer
para o pessoal economizar água para não ter racionamento. Em último caso, fazer
o quê, racionamento mesmo. Mas claro que, em ano eleitoral, o negócio é se
garantir até depois do pleito, é bumba-meu-boi e em 2015 em a gente vê.
Quando
o nível do Cantareira chegou a menos de 15%, e não dava mais pra esconder o
problema, a Sabesp começou a fazer racionamento (“rodízio”, em tucanês)
extraoficial em diversos bairros da periferia, embora negasse (e continue
negando).
Cantareira
em 10%, e aí não é mais falta d’água, é “stress hídrico”. Alckmin inventa um
plano esdrúxulo para tirar água do Rio de Janeiro (como se isso pudesse ser
feito em curto prazo). A presidente da Sabesp anuncia multa (!) para quem
gastar mais água – mas ela prefere chamar isso de “contingência tarifária”.
Chegamos
a maio, Cantareira em menos de 8%. E as lorotas seguem. O volume morto agora é
“reserva técnica” (sim, como algo que está lá para ser usado mesmo, e que já
estava nos planos), e essa água é “perfeita, igual às outras” – embora
especialistas digam que o processo para tratá-la é 40% mais caro, e que, mesmo
assim, não elimina os metais pesados que devem estar lá no volume morto.
E
esta semana, finalmente, a melhor: Estado, Folha, G1, R7, todo mundo reproduz
material do DAEE dizendo que uma seca tão grande em época de chuvas só se
repete a cada 3.378 anos (!). E, mais uma, não há qualquer contestação a isso.
O
que se sabe é que a partir de hoje, 15 de maio, sairá das nossas torneiras e
nossos chuveiros água aditivada com chumbo, cádmio, mercúrio e outras iguarias.
Um brinde ao eleitor paulista e à sua imprensa, a melhor assessoria que um
governo poderia ter.