Escrito com Shepones
Não interessa contra o que ou contra quem. Com razão ou sem razão, sabendo do que se fala ou não, o negócio é reclamar geral. Eis as melhores músicas de protesto já feitas:
Até Quando Esperar? (Plebe Rude)
Capitulo 4, Versículo 3 (Racionais MCs)
How Many Tears (Helloween)
Like A Song (U2)
Masters Of War (Bob Dylan)
Perfeição (Legião Urbana)
Redemption Song (Bob Marley)
Selvagem? (Os Paralamas Do Sucesso)
Todas do Rage Against The Machine
War Pigs (Black Sabbath)
Não gostou? Protesta, ué.
terça-feira, 30 de junho de 2009
quinta-feira, 18 de junho de 2009
I was looking for a job and then I found a job and Heaven knows I'm miserable now.
Onze sugestões de empreendimento para os recém-desprofissionalizados jornalistas
Escrito com Shepones
01. Vender Avon
02. Fazer malabares no semáforo
03. Agenciar prostituição infantil no Ceasa
04. Plantar maconha no litoral da Bahia
05. Ser porteiro de bordel na Augusta
06. Revender tele-sena vencida
07. Ser homem-sanduíche de "Compro Ouro" no Centrão
08. Vender pomada da banha do peixe-boi da amazônia no trem
09. Fingir-se de mudo e vender adesivo do Piu-Piu no bumba
10. Oferecer-se como cobaia para teste de novos medicamentos
11. Preparar tapiocas no Centro De Tradições Nordestinas (CTN)
Escrito com Shepones
01. Vender Avon
02. Fazer malabares no semáforo
03. Agenciar prostituição infantil no Ceasa
04. Plantar maconha no litoral da Bahia
05. Ser porteiro de bordel na Augusta
06. Revender tele-sena vencida
07. Ser homem-sanduíche de "Compro Ouro" no Centrão
08. Vender pomada da banha do peixe-boi da amazônia no trem
09. Fingir-se de mudo e vender adesivo do Piu-Piu no bumba
10. Oferecer-se como cobaia para teste de novos medicamentos
11. Preparar tapiocas no Centro De Tradições Nordestinas (CTN)
terça-feira, 16 de junho de 2009
No fim da tarde, a sensação da missão cumprida
Engraçado como as pessoas se interessam mais pelas eleições do Irã do que pelas do Brasil. Vide os escroques que temos elegido, especialmente em São Paulo.
Lembrou-me 1999, no primeiro ano da faculdade, quando uma mina me abordou no corredor pedindo uma doação para os refugiados de Kosovo. Respondi: ah, legal, mas por que antes vocês não arrecadam alguns mantimentos para aquelas famílias que moram no viaduto que fica a 100 metros daqui?
Exceto quando se trata da África (porque aí ninguém liga mesmo) as pessoas parecem ficar com a consciência mais tranqüila quando “ajudam” sem se envolver.
E vale notar que esses supostos interesses vão e vêm ao sabor da mídia. Cada semana é uma comoção diferente que assola essa “gente honesta, boa e comovida”. Aposto um picolé de limão que os persas serão esquecidos, em prol de um novo assunto (seja um moleque arrastado pelas ruas ou uma cantora gorda internada por estresse) mais rapidamente do que você consegue dizer “Mahmoud Ahmadinejad”.
Ah, vou doar roupas velhas pra Santa Catarina, adotar financeiramente um moleque da LBV que nunca precisarei ver na vida e colocar no Orkut um avatar “Free Palestina” (mesmo que eu sequer saiba apontá-la no mapa).
Porém, quando o pivete da esquina aparece, fecho o vidro. Quando vejo o mendigo dormindo sob uma marquise, viro o rosto.
Dou minhas ofertas na igreja, mas não sei amar o próximo. Só o distante.
Lembrou-me 1999, no primeiro ano da faculdade, quando uma mina me abordou no corredor pedindo uma doação para os refugiados de Kosovo. Respondi: ah, legal, mas por que antes vocês não arrecadam alguns mantimentos para aquelas famílias que moram no viaduto que fica a 100 metros daqui?
Exceto quando se trata da África (porque aí ninguém liga mesmo) as pessoas parecem ficar com a consciência mais tranqüila quando “ajudam” sem se envolver.
E vale notar que esses supostos interesses vão e vêm ao sabor da mídia. Cada semana é uma comoção diferente que assola essa “gente honesta, boa e comovida”. Aposto um picolé de limão que os persas serão esquecidos, em prol de um novo assunto (seja um moleque arrastado pelas ruas ou uma cantora gorda internada por estresse) mais rapidamente do que você consegue dizer “Mahmoud Ahmadinejad”.
Ah, vou doar roupas velhas pra Santa Catarina, adotar financeiramente um moleque da LBV que nunca precisarei ver na vida e colocar no Orkut um avatar “Free Palestina” (mesmo que eu sequer saiba apontá-la no mapa).
Porém, quando o pivete da esquina aparece, fecho o vidro. Quando vejo o mendigo dormindo sob uma marquise, viro o rosto.
Dou minhas ofertas na igreja, mas não sei amar o próximo. Só o distante.
segunda-feira, 8 de junho de 2009
The dark side of the meal
Manual De (Má) Conduta Para Funcionários do Mc Habob's
01. Tire esse sorriso do rosto já! Um funcionário do Mc Habob’s jamais sorri. Ele não tem motivos para isso.
02. Treine olhares impassíveis, cheios de blasê, para atender os clientes.
03. Não preste muita atenção nos pedidos: faz parte do charme do lugar receber lanches errados, e, ao reclamar, ouvir algo como “tenho certeza de que você pediu isso”.
04. Treine uma cara de hiena faminta para quando o cliente ameaçar não pagar os 10%, ainda que seu atendimento seja do nível de Auschwitz.
05. Quando alguém reclamar que o pedido está errado, como um refri com pedras de gelo o qual o cliente alega ter pedido sem elas, insista silenciosa e obstinadamente empurrando o copo para ele. Mostre sua força de vontade.
06. Treine lutinha com esfirras na cozinha, acertando os outros funcionários (acintosamente, pra que os clientes vejam) e arremesso de beirute com ovo gosmento no prato do freguês, de modo que o lanche dê uma dropada tipo half-pipe nas bordas.
07. Use o tratamento “senhor” a cada três palavras, ainda que não faça sentido, só para irritar o cliente e fazê-lo se sentir um número sem importância.
08. Desconte sua insatisfação com o trabalho escravo e o salário de fome despejando fluidos corporais nos lanches e nunca lavando as mãos após coçar a bunda.
09. A primeira regra do Mc Habob’s é que você não sabe do que é feita a carne do Mc Habob’s.
10. O queijo eu te conto: é feito do mesmo material da caixinha em que vêm os lanches.
01. Tire esse sorriso do rosto já! Um funcionário do Mc Habob’s jamais sorri. Ele não tem motivos para isso.
02. Treine olhares impassíveis, cheios de blasê, para atender os clientes.
03. Não preste muita atenção nos pedidos: faz parte do charme do lugar receber lanches errados, e, ao reclamar, ouvir algo como “tenho certeza de que você pediu isso”.
04. Treine uma cara de hiena faminta para quando o cliente ameaçar não pagar os 10%, ainda que seu atendimento seja do nível de Auschwitz.
05. Quando alguém reclamar que o pedido está errado, como um refri com pedras de gelo o qual o cliente alega ter pedido sem elas, insista silenciosa e obstinadamente empurrando o copo para ele. Mostre sua força de vontade.
06. Treine lutinha com esfirras na cozinha, acertando os outros funcionários (acintosamente, pra que os clientes vejam) e arremesso de beirute com ovo gosmento no prato do freguês, de modo que o lanche dê uma dropada tipo half-pipe nas bordas.
07. Use o tratamento “senhor” a cada três palavras, ainda que não faça sentido, só para irritar o cliente e fazê-lo se sentir um número sem importância.
08. Desconte sua insatisfação com o trabalho escravo e o salário de fome despejando fluidos corporais nos lanches e nunca lavando as mãos após coçar a bunda.
09. A primeira regra do Mc Habob’s é que você não sabe do que é feita a carne do Mc Habob’s.
10. O queijo eu te conto: é feito do mesmo material da caixinha em que vêm os lanches.
quarta-feira, 3 de junho de 2009
Quem vê caramujo, não vê coração.
Uma noite com o caramujinho guitarrista (II)
Após o ensaio de sábado à noite, o caramujinho foi convidado pelos outros integrantes, as lesmas, para curtir uma balada. Gastrópode que é, tem preguiça de ficar fora do casulo a noite toda. Mas insistiram tanto que acabou aceitando. Foram a um pico que, diziam, teria open-bar.
_Open-bar? Por que não disseram antes, vamos, suas lesmas!
Tá certo que esse termo é sinônimo de roubada, visto que espanta as caramujinhas, atrai caracóis bêbados e só contêm bebidas que nem um visigodo que levou fora da concumbina aceitaria.
Mas aquilo era demais pro caramujinho.
O interior parecia que havia pegado fogo, sido atingido por um aerólito e depredado por hordas de ETs belicosos.
O banheiro era o círculo infernal ao qual Virgílio não teve coragem de levar Dante, com medo de perder a amizade. Devia haver ali cepas de todas as doenças mais mortíferas, de varíola a ebola, passando por peste negra e gripe espanhola.
O open-bar era composto de bebidas altamente nocivas, certamente aparentadas do zyklon-B, do BHC e do ácido muriático. Achou que o bar só estava open porque o Conselho de Segurança da ONU não teve coragem de ir até lá verificar as armas de destruição em massa.
Desejou que aquelas lesmas secassem num cimentado em dia de sol.
No palco, em meio a um calor que deixava o ar mefítico irrespirável com seus miasmas, uma banda cover assassinava Stone Temple Pilots com solos fora de escala e vocal fraquinho embromando no ingrêis.
_Vou embora.
(Leia com sotaque bêbado)
_Vai nada, caramujinho, fica aí, vai ter mais bandas, tem bebida de graça.
_Suas lesmas, eu não vou beber esses venenos. Tô indo, é sério.
Foi embora.
Tinha um caracol em coma alcoólico, tentando ser reanimado pelos amigos. Outro vomitado na escada, perto da porta.
E não era nem uma da madrugada.
Após o ensaio de sábado à noite, o caramujinho foi convidado pelos outros integrantes, as lesmas, para curtir uma balada. Gastrópode que é, tem preguiça de ficar fora do casulo a noite toda. Mas insistiram tanto que acabou aceitando. Foram a um pico que, diziam, teria open-bar.
_Open-bar? Por que não disseram antes, vamos, suas lesmas!
Tá certo que esse termo é sinônimo de roubada, visto que espanta as caramujinhas, atrai caracóis bêbados e só contêm bebidas que nem um visigodo que levou fora da concumbina aceitaria.
Mas aquilo era demais pro caramujinho.
O interior parecia que havia pegado fogo, sido atingido por um aerólito e depredado por hordas de ETs belicosos.
O banheiro era o círculo infernal ao qual Virgílio não teve coragem de levar Dante, com medo de perder a amizade. Devia haver ali cepas de todas as doenças mais mortíferas, de varíola a ebola, passando por peste negra e gripe espanhola.
O open-bar era composto de bebidas altamente nocivas, certamente aparentadas do zyklon-B, do BHC e do ácido muriático. Achou que o bar só estava open porque o Conselho de Segurança da ONU não teve coragem de ir até lá verificar as armas de destruição em massa.
Desejou que aquelas lesmas secassem num cimentado em dia de sol.
No palco, em meio a um calor que deixava o ar mefítico irrespirável com seus miasmas, uma banda cover assassinava Stone Temple Pilots com solos fora de escala e vocal fraquinho embromando no ingrêis.
_Vou embora.
(Leia com sotaque bêbado)
_Vai nada, caramujinho, fica aí, vai ter mais bandas, tem bebida de graça.
_Suas lesmas, eu não vou beber esses venenos. Tô indo, é sério.
Foi embora.
Tinha um caracol em coma alcoólico, tentando ser reanimado pelos amigos. Outro vomitado na escada, perto da porta.
E não era nem uma da madrugada.
Diga-me o que comes, e eu te direi que estás fudido.
As piores coisas que já passaram pelo meu combalido estômago:
05. Dogão do Sesc Itaquera: no geral os rangos do Sesc são bons e baratos, mas o hot-morte dessa unidade é feito com o pão que o Diabo amassou e salsicha de pneu e gato atropelado. E ainda deu dor de barriga no dia seguinte.
04. “Cerveja” Liber no Pacaembu: embora nos arredores você possa comer um incrível e tradicional sanduba de pernil, um suspeito sanduga de lingüiça feita com algum animal ainda não registrado pelo Ibama, e tomar de cerveja a rabo-de-galo, dentro do estádio a hipocrisia reina: vendem-se hambúrgueres horríveis, sorvetes semiderretidos, refrigerantes genéricos do tipo Carrefour-Cola (vendida como “Pepsi”) e a temível Liber, que tem gosto de pão velho molhado. Pior que isso só o Corinthians de 2006-2007.
03. Hambúrguer do Lulu: para um domingão frio e aziago no Pacaembu, durante um (ótimo) show mal divulgado do Lulu Santos, um hambúrguer frio e aziago, saboroso como o isopor no qual estava acondicionado.
02. Coxinha do Oldboy: devia estar sem sal. Deve ter sido de propósito, coisa de funcionário que pretende ferrar a imagem da empresa. O salgado ingerido na Uno & Due da Galeria Gemini, antes da sessão de Oldboy, foi como mastigar um saco de cimentcola.
01. Dogão do U2: não foi um dia fácil. Para ver a melhor banda do mundo pela segunda vez, enfrentei trampo o dia todo, maratona num puta calor até o Morumbi, grandes filas para entrar e sair, chuva na hora de ir embora e uma lotação cheirando a hiena velha. Mas nada supera do cachorro-quente deglutido na porta de entrada: uma salsicha feita provavelmente com garrafas PET recicladas num um pão ázimo que sobrou da Santa Ceia. E custou caro.
05. Dogão do Sesc Itaquera: no geral os rangos do Sesc são bons e baratos, mas o hot-morte dessa unidade é feito com o pão que o Diabo amassou e salsicha de pneu e gato atropelado. E ainda deu dor de barriga no dia seguinte.
04. “Cerveja” Liber no Pacaembu: embora nos arredores você possa comer um incrível e tradicional sanduba de pernil, um suspeito sanduga de lingüiça feita com algum animal ainda não registrado pelo Ibama, e tomar de cerveja a rabo-de-galo, dentro do estádio a hipocrisia reina: vendem-se hambúrgueres horríveis, sorvetes semiderretidos, refrigerantes genéricos do tipo Carrefour-Cola (vendida como “Pepsi”) e a temível Liber, que tem gosto de pão velho molhado. Pior que isso só o Corinthians de 2006-2007.
03. Hambúrguer do Lulu: para um domingão frio e aziago no Pacaembu, durante um (ótimo) show mal divulgado do Lulu Santos, um hambúrguer frio e aziago, saboroso como o isopor no qual estava acondicionado.
02. Coxinha do Oldboy: devia estar sem sal. Deve ter sido de propósito, coisa de funcionário que pretende ferrar a imagem da empresa. O salgado ingerido na Uno & Due da Galeria Gemini, antes da sessão de Oldboy, foi como mastigar um saco de cimentcola.
01. Dogão do U2: não foi um dia fácil. Para ver a melhor banda do mundo pela segunda vez, enfrentei trampo o dia todo, maratona num puta calor até o Morumbi, grandes filas para entrar e sair, chuva na hora de ir embora e uma lotação cheirando a hiena velha. Mas nada supera do cachorro-quente deglutido na porta de entrada: uma salsicha feita provavelmente com garrafas PET recicladas num um pão ázimo que sobrou da Santa Ceia. E custou caro.
Quem disse que caramujo não tem coração?
As aventuras do caramujinho jornalista (I)
Era uma vez um caramujinho que fazia frilas.
Um dia uma borboletinha, aconselhada por outra borboleta, ligou para o caramujo e lhe ofereceu um freelance que ela não conseguiria fazer a tempo.
_Olá caramujinho, tudo bem?
_Tudo bem, borboletinha, e você?
E, numa cordial conversa, os termos do trabalho ficaram acertados, com todos os contatos e todas as coordenadas.
Faltava falar com o cliente, o besouro rola-bosta.
_Olá rola-bosta, tudo bem?
_Tudo bem, caramujinho, e você?
O besouro explicou que era um trabalho insano, muita coisa em pouco tempo. “Pelo menos poderei cobrar bastante”, pensou o ressabiado caramujinho.
No dia seguinte o caramujinho, mesmo tendo acordado com uma forte dor de barriga, vômito e enxaqueca, decidiu cumprir seus compromissos. Deslizou até o médico, onde tinha consulta marcada havia tempos. Sendo um molusco pobre, com casca de segunda mão, que utiliza o SUS, ficou esperando um tempão, mesmo com hora marcada. De lá, escorregou até o terminal de ônibus, onde engoliu a segunda pior coxinha de sua vida (fez até uma nota mental de listar depois os piores rangos que já comera), e seguiu para o longínquo cliente.
E o caramujinho foi. E foi. E foi. O lugar parecia nunca chegar. Que jardim distante! De terminal em terminal, de ônibus em ônibus, o pequeno molusco morria de calor dentro de sua carapaça que ardia sob o sol daquela tarde abafada. Desceu já atrasado, às pressas, quando viu que o enésimo ônibus que pegara não chegaria onde deveria. E o caramujinho andou. Andou. Andou. Mal havia muco suficiente para se arrastar por aquele caminho imenso, desconhecido, cheio de perigos. Resolveu perguntar a todos que apareciam
_Olá centopéia, onde fica este endereço?
_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àqueles cupins?
_Olá cupins, onde fica este endereço?
_Não sabemos, caramujinho. Por que não pergunta àquele louva-a-deus?
_Olá louva-a-deus, onde fica este endereço?
_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àquela aranha?
O caramujinho se sentiu perdido num imenso formigueiro, sem saber aonde ir. Por sorte sua joaninha-madrinha lhe telefonou, procurou o endereço na internet e corrigiu a rota do pequeno caramujo, já tão cansado e apreensivo.
_Olá caramujinho, você já andou tanto, mas agora nem está tão longe. Continue à direita, naqueles arbustos.
_Obrigado fada-joaninha. Serei eternamente grato.
Mas o pior estava pior vir: quando chegou à esquina do jardim, viu um imenso vale que deveria atravessar. Era tão colossal, e o caramujinho já estava tão cansado e atrasado, que só conseguiu pensar no Ice Blue, dos Racionais MCs, falando, em A Vítima:
“MANO, FOI UM ARREGAÇO!...”
E o caramujinho desceu o vale infindável.
Desceu.
Desceu.
Desceu.
No ponto mais fundo, sentiu o ar faltando como se estivesse no fundo do oceano.
Subiu.
Subiu.
Subiu.
O vento quente lhe ardia nos pulmões, o suor deixava seu corpo ainda mais escorregadio dentro do casco. Achou que ia infartar, de tanto que o coração palpitava.
Chegou ao local, com saudade de um banho relaxante em seu cogumelo, na companhia de sua caramujinha.
Suou de derramar cascatas enquanto esperava o cliente, sob os olhares enviesados da secretária taturana.
Quando finalmente foi atendido, naquele ambiente impessoal de grande fábrica, e foi formalmente apresentado pelo rola-bosta ao décimo terceiro trabalho de Hércules, aquele que ele recusou porque não ia dar tempo.
_Quanto você cobra por isso?
_Dez flores murchas.
_Tudo isso? Só posso pagar três.
_Esse preço é ridículo.
_O outro caramujo fez por duas flores. E nem estavam murchas.
_É, e o trabalho ficou uma merda.
_Ah, faz um desconto, vai. Quatro flores, ta bom?
O caramujinho pensou em torturar aquele ganancioso rola-bosta e todos os seus familiares. Mas havia viajado tanto até ali, o dia havia sido tão cansativo, que acabou aceitando.
Na saída, tentando minimizar seu prejuízo pessoal, inquiriu o besouro pão-duro:
_Pô seu rola-bosta, você me ensinou o caminho errado, não é possível. Tive que deslizar tanto que até me faltou muco pra voltar agora. Atravessei um longo jardim, canteiros estranhos e um vale gigantesco... e ontem você disse que era pertinho!...
_Ah, você veio de ônibus? O caminho era pra vir de carro! De ônibus tem um ponto ali pertinho, na esquina.
¬¬
Sentindo-se um caramujo prostituído, passou num boteco para comprar uma cerveja e dar uma conferida no final da Champions League.
Achou um velho com uma camisa do Corinthians na esquina. Perguntou a ele se o ônibus desejado passava ali, para então emendar:
_Hoje tem Coringão, hein? Dois a zero no Vasquinho?
_Opa, hoje a gente ganha fácil.
Ele jamais havia puxado conversa com um estranho, em toda a sua lenta vida. Alguma coisa havia mudado naquela tarde baça, e era a expressão estóica de um caramujinho que acreditava mais em si.
E a noite chegou como um manto alvinegro, pousando suavemente sobre aquele coração exausto.
Era uma vez um caramujinho que fazia frilas.
Um dia uma borboletinha, aconselhada por outra borboleta, ligou para o caramujo e lhe ofereceu um freelance que ela não conseguiria fazer a tempo.
_Olá caramujinho, tudo bem?
_Tudo bem, borboletinha, e você?
E, numa cordial conversa, os termos do trabalho ficaram acertados, com todos os contatos e todas as coordenadas.
Faltava falar com o cliente, o besouro rola-bosta.
_Olá rola-bosta, tudo bem?
_Tudo bem, caramujinho, e você?
O besouro explicou que era um trabalho insano, muita coisa em pouco tempo. “Pelo menos poderei cobrar bastante”, pensou o ressabiado caramujinho.
No dia seguinte o caramujinho, mesmo tendo acordado com uma forte dor de barriga, vômito e enxaqueca, decidiu cumprir seus compromissos. Deslizou até o médico, onde tinha consulta marcada havia tempos. Sendo um molusco pobre, com casca de segunda mão, que utiliza o SUS, ficou esperando um tempão, mesmo com hora marcada. De lá, escorregou até o terminal de ônibus, onde engoliu a segunda pior coxinha de sua vida (fez até uma nota mental de listar depois os piores rangos que já comera), e seguiu para o longínquo cliente.
E o caramujinho foi. E foi. E foi. O lugar parecia nunca chegar. Que jardim distante! De terminal em terminal, de ônibus em ônibus, o pequeno molusco morria de calor dentro de sua carapaça que ardia sob o sol daquela tarde abafada. Desceu já atrasado, às pressas, quando viu que o enésimo ônibus que pegara não chegaria onde deveria. E o caramujinho andou. Andou. Andou. Mal havia muco suficiente para se arrastar por aquele caminho imenso, desconhecido, cheio de perigos. Resolveu perguntar a todos que apareciam
_Olá centopéia, onde fica este endereço?
_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àqueles cupins?
_Olá cupins, onde fica este endereço?
_Não sabemos, caramujinho. Por que não pergunta àquele louva-a-deus?
_Olá louva-a-deus, onde fica este endereço?
_Não sei, caramujinho. Por que não pergunta àquela aranha?
O caramujinho se sentiu perdido num imenso formigueiro, sem saber aonde ir. Por sorte sua joaninha-madrinha lhe telefonou, procurou o endereço na internet e corrigiu a rota do pequeno caramujo, já tão cansado e apreensivo.
_Olá caramujinho, você já andou tanto, mas agora nem está tão longe. Continue à direita, naqueles arbustos.
_Obrigado fada-joaninha. Serei eternamente grato.
Mas o pior estava pior vir: quando chegou à esquina do jardim, viu um imenso vale que deveria atravessar. Era tão colossal, e o caramujinho já estava tão cansado e atrasado, que só conseguiu pensar no Ice Blue, dos Racionais MCs, falando, em A Vítima:
“MANO, FOI UM ARREGAÇO!...”
E o caramujinho desceu o vale infindável.
Desceu.
Desceu.
Desceu.
No ponto mais fundo, sentiu o ar faltando como se estivesse no fundo do oceano.
Subiu.
Subiu.
Subiu.
O vento quente lhe ardia nos pulmões, o suor deixava seu corpo ainda mais escorregadio dentro do casco. Achou que ia infartar, de tanto que o coração palpitava.
Chegou ao local, com saudade de um banho relaxante em seu cogumelo, na companhia de sua caramujinha.
Suou de derramar cascatas enquanto esperava o cliente, sob os olhares enviesados da secretária taturana.
Quando finalmente foi atendido, naquele ambiente impessoal de grande fábrica, e foi formalmente apresentado pelo rola-bosta ao décimo terceiro trabalho de Hércules, aquele que ele recusou porque não ia dar tempo.
_Quanto você cobra por isso?
_Dez flores murchas.
_Tudo isso? Só posso pagar três.
_Esse preço é ridículo.
_O outro caramujo fez por duas flores. E nem estavam murchas.
_É, e o trabalho ficou uma merda.
_Ah, faz um desconto, vai. Quatro flores, ta bom?
O caramujinho pensou em torturar aquele ganancioso rola-bosta e todos os seus familiares. Mas havia viajado tanto até ali, o dia havia sido tão cansativo, que acabou aceitando.
Na saída, tentando minimizar seu prejuízo pessoal, inquiriu o besouro pão-duro:
_Pô seu rola-bosta, você me ensinou o caminho errado, não é possível. Tive que deslizar tanto que até me faltou muco pra voltar agora. Atravessei um longo jardim, canteiros estranhos e um vale gigantesco... e ontem você disse que era pertinho!...
_Ah, você veio de ônibus? O caminho era pra vir de carro! De ônibus tem um ponto ali pertinho, na esquina.
¬¬
Sentindo-se um caramujo prostituído, passou num boteco para comprar uma cerveja e dar uma conferida no final da Champions League.
Achou um velho com uma camisa do Corinthians na esquina. Perguntou a ele se o ônibus desejado passava ali, para então emendar:
_Hoje tem Coringão, hein? Dois a zero no Vasquinho?
_Opa, hoje a gente ganha fácil.
Ele jamais havia puxado conversa com um estranho, em toda a sua lenta vida. Alguma coisa havia mudado naquela tarde baça, e era a expressão estóica de um caramujinho que acreditava mais em si.
E a noite chegou como um manto alvinegro, pousando suavemente sobre aquele coração exausto.
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