sexta-feira, 28 de março de 2008

O povo é ignorante e o governo é uma piada.

Não sei como é em outros países, mas, no Brasil, os pais normalmente não incutem nos filhos o gosto pela (boa) literatura porque também foram educados mal na escola. Convenhamos, escola é um negócio chato pracaralho, em todas as matérias; tudo é ensinado nas coxas, de forma antiquada, por professores mal preparados e engessados por grades curriculares as quais os velhotes do MEC estão pouco ligando se ainda funcionam ou não.

Tive sorte de aprender a ler (sozinho) com três anos e a escrever com quatro porque, a despeito de ter pais que não foram educados com livros, souberam me ensinar; por isso sempre convivi com boas leituras, desde sempre. Porém, se fosse depender da escola, estava fudido.

Especificamente no caso da literatura, as coisas até começam bem no ginásio: eu estudei sempre em escola pública (estadual) e tive boas leituras das inefáveis séries Vaga-Lume e Para Gostar De Ler. É promissor, vejam só, mesmo para crianças que não lêem em casa, terem o primeiro contato literário com Lúcia Machado de Almeida, Drummond, LFV, Lourenço Diaféria, Ignácio de Loyola, etc. Ainda há o problema da obrigatoriedade, de aquilo ser "para nota", "para prova", mas não vou entrar nessa questão agora.

Só que, quando chega no colegial, qualquer semente literária plantada no Ensino Fundamental é impiedosamente pisoteada pela grade curricular: até hoje ninguém me convenceu do porquê de se ensinar Literatura Brasileira em ordem cronológica, visto que as correntes literárias, longe de se complementarem seqüencialmente, geralmente negam o imediatamente anterior. Assim o pobre moleque chega no Ensino Médio e lá vem as chatíssimas novelas de cavalaria, Os Lusíadas, Gil Vicente... quem vai tomar gosto pela leitura com "as armas e os barões assinalados", me diz?

Custava fazer ao contrário, por exemplo? Começar pelos escritores contemporâneos, pra molecada pegar o gosto, ver que ler não é necessariamente um troço chato e pedante, para que ele vá evoluindo “na contramão”? Começa-se fisgando o aluno com LFV, Mário Prata, Rubem Braga; e vai-se voltando, com Drummond, Graciliano, Ignácio; até que, no final do curso (terceiro ano), quando o aluno tiver que encarar literatura colonial, barroca, classicista e medieval, terá uma visão contemporizadora daquilo, sem anacronismos.

Ele poderá até continuar achando Senhora um livro chato pra caralho, mas vai entender melhor o contexto de tudo aquilo, e respeitá-lo-á por já ter uma bagagem montadinha estofada pelos clássicos modernos e contemporâneos.

Ah, também não sei como é mundo afora, mas acho um absurdo não haver nada de literatura mundial em favorecimento da literatura colonial lusófona.

3 comentários:

Anônimo disse...

Discordo. Na verdade, esses autores contemporâneos já são - ou pelo menos deveriam - ser apresentados no Ensino Fundamental. Acompanhando os últimos PNLDs lançados, todos exploram muito bem todos eles. Com essa nova onda do interdisciplinar, então, tem intertextualidade literária até nos livros de Matemática. E não são poucas. Contudo, os sem-luz já deveriam entrar no Ensino Médio com uma boa bagagem literária, principalmente contemporânea, inclusive mundial.
Esses dias, fuçando aqui nos PNLDs que eu roubei em uma escola e analisando os que eu preciso ler no trabalho vejo que, caralho, tá tudo ali no programa, disposto, bonitão. Depois de tanta aula de Didática e Currículo, é óbvio que tenho um pé atrás com livros didáticos, que acredito ser de uma redundância enorme os caça-resposta-óbvio a partir de releituras e mais releituras chatas de parágrafos, mas em uma coisa concordo... os textos, hoje, são de uma qualidade ímpar. E a sugestão de leituras na íntegra idem (idem para a sugestão de filmes, de músicas). E isso é o máximo que um livro didático pode fazer. Sugerir. O que quero dizer é o óbvio. O problema está nos (pseudo) educadores.
Quanto a cronologia, acho que já falei contigo a respeito. Nem na graduação é diferente. E nem acredito que poderia ser. É meio estranho, mesmo, esse toma-lá que a gente recebe a cada corrente literária, pois elas realmente contrariam as características do movimento anterior e relembram o anterior do anterior, mas há uma série de menções históricas que acompanham esses movimentos que, se não apresentadas na ordem cronológica, seria bem confuso de entender. Acho que não teria problema algum aprender em ordem cronológica se realmente ensinassem literatura como se deveria ensinar, inclusive com apoio nas demais artes que, não raro, são excluídas das aulas, mas estão intimamente ligadas aos movimentos.
Quanto a Senhora, não acho chato pra caralho coisa nenhuma. Acho lindo, lindo :P

majv disse...

eu concordo, é verdade que chega um momento na vida em que se lê tudo que aparece pela frente, jogando críticas até para quem não pediu, mas antes de disso somos todos crianças desinteressadas por informações, precisando de um pontapé inicial para sair lendo até bula de remédio.
=D

Anônimo disse...

há de se concordar: quantos professores chatíssimos de literatura tivemos durante nossa trajetória escolar? eu, pelo menos, só vim ter professor bom desse ramo nos cursinhos pro vestibular, mesmo tendo que dar muita coisa mastigadinha e ter que estimular "a geral" na maior correria.
Eu lembro que no meu 1° ano, tive um professor de literatura histérico, que perdia mais tempo da aula se trocando com os alunos que ridicularizavam as poesias que ele escolhia pra dar aula, do que mostrando o valor daquilo pra contexto x ou y... no 3°, era um sobrevivente da era pré-histórica, que só fazia cuspir em todos que sentavam na primeira fileira e contar piadinhas infames... Eu, que adoro literatura e sempre fui muito estimulada aqui em casa, detestava essas aulas. "Ensinar" literatura é um troço complicado. É como filosofia: não adianta sair falando dos pensadores e suas teorias, se o aluno ainda vive na cegueira da mediocridade - ou, como diz um professor meu, ainda não foi picado pelo mosquito.